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A Nigéria e as multinacionais petroleiras

Por Pierre Tisserand

Jornal Hora do Povo - 06 de Junho de 2012

http://www.horadopovo.com.br/2012/06Jun/3067-22-06-2012/P6/pag6f.htm

A qualidade excepcional faz do petróleo nigeriano uma mercadoria cobiçada. O ocidente , sobretudo, é a ele ligado há mais de meio século. Em particular desde que a Cia. Holandesa Shell descobriu em 1956 o ouro negro no delta do Níger, o que marcou a tomada pelo ocidente da indústria petroleira nigeriana. O cenário petroleiro desse drama é muito simples: tanto os lucros tirados da exploração do petróleo quanto o petróleo mesmo ficam com as multinacionais ocidentais envolvidas nesse grande negócio. O povo nigeriano não vê sequer a cor do dinheiro ou dos benefícios da exploração.

A presença das gigantes do petróleo ocidentais traz consigo a violência repressiva que à época da Royal Niger Company (empresa britânica do século XIX encarregada pelo governo de defender os interesses britânicos na região com mão de ferro se necessário). O que explica porque o Delta do Níger é hoje uma das regiões mais poluídas e das mais violentas e pobres do mundo.

Não é um acaso que em 2008, desde a criação do AFRICOM, o comando das forças americanas na África, o Exército americano realiza um exercício batisado de "Unifies Quest 2008" no US War College em Carlyle na Pennsylvania para avaliar como o AFRICOM reagiria em caso de guerra civil na Nigéria. O ponto de partida é o controle pelos rebeldes dos campos petrolíferos no Delta e a contestação a suposto golpe de estado dos EUA. 20 mil soldados americanos são encarregados de assegurar esses campos de petróleo.

O tabuleiro de jogo da Shell, Total, Exxon Mobil et Cia.

As gigantes petroleiras ocidentais, Royal Dutch Shell (Holanda), Total (França), Agip (Itália), Exxon Mobil (EUA), Chevron (EUA) controlam 95% da indústria petroleira nigeriana através de joint ventures.

Desperdício de petróleo e gás, poluição do solo e exploração das populações locais acompanham essa posição dominante.

20% do petróleo vai para os países europeus, 5% para o Canadá e a Austrália enquanto os EUA se apoderam da maior parte do bolo, 43%. Enquanto a quase totalidade da produção petroleira é exportada ao estrangeiro, a Nigéria tem que importar perto de 187 mil barris por dia a preços excessivos. Uma situação absurda devido à má gestão das quatro refinarias petroleiras do país e a falta de uma indústria nacional para produtos derivados do petróleo. O governo nige- riano contribui para isso trocando petróleo por garrafas de vinho. Desde 1960, 360 bilhões de dólares foram para o bolso de políticos corruptos.

Democracia em ação

A Nigéria é um dos principais fornecedores de petróleo dos EUA e seu 17º parceiro comercial com um número anual de 22 bilhões de dólares em 2009.

Washington é igualmente a lei no cenário político nigeriano ainda que a política nigeriana tenha sua própria lógica. Não é por acaso que em 2010, antes das eleições presidenciais na Nigéria, o presidente americano Barak Obama qualificou o grande "favorito" Goodluck Jonathan como o "democrata em ação". Graças aos fundos alocados em ajuda ao desenvolvimento pelos EUA e Reino Unido e graças à sustentação dos conselheiros americanos e britânicos, Jonathan ganhou as eleição mesmo sem ter nenhum programa concreto. Para Johnnie Carson, Secretário de Estado norte-americano para assuntos estrangeiros para a África, essas eleições, como ele declarou em abril de 2012, "são as mais democráticas desde 1999".

Para Washington o católico Jonathan, no sul, deveria a todo custo ganhar as eleições porque o candidato mussulmano, Muhammadu Buhari, do norte, não teria feito mais que agravar a situação de instabilidade. Ora, depois da entrada em função de Jonathan o norte do país desatou uma guerra civil.

O verdadeiro Boko Haran

O papel do Islã na política nigeriana é também muito complexo. E a influência do ocidente foi destrutiva e contribuiu para o isolamento do norte. Os EUA e o Reino Unido sustentam - com importantes somas de dinheiro e propaganda – a elite muçulmana tradicional o fundamentalismo muçulmano. Mas antes de assegurar uma maior estabilidade, isso, ao contrário, agrava a instabilidade. É assim que apareceu o fenômeno "Boko Haran". É o nome dado pelos nigerianos aos movimentos que semeiam o terror no norte do país: seja o dos fundamentalistas, seja o dos bandos de malfeitores a serviço dos maus políticos do país.

Os EUA criaram seu próprio Boko Haran mítico e assim encontraram o pretexto ideal que queriam para se imiscuir na cena política nigeriana em nome da luta contra o terrorismo e assim aumentar sua presença. Em um recente relatório especial sobre o fenômeno Boko Haran uma comissão da Câmara de Representantes americana concluiu que "era necessário aumentar a cooperação com os serviços secretos nigerianos e o exército para poder melhor combater a ameaça que constitui Boko Haran para os interesses nigerianos e americanos". Mas o relatório não disse uma palavra de protesto contra a corrupção, o FMI, o Banco Mundial e a pobreza. Entre os slogans um denunciava a corrupção da indústria petroleira qualificada de verdadeiro Boko Haran.

Interesses norte-americanos versus "Occupy Nigeria"

Em janeiro de 2012 o ministro nigeriano do petróleo , Diezani K. Alison Madueke e o ministro da economia, Ngozi Okonjo Iweala suprimiram os subsídios para o carbureto sob as ordens do FMI. Esses dois ministros tinham sido anteriormente empregados da Shell (Madueke) e Banco Mundial (Iweala).

A supressão do subsídio provocou uma forte alta dos preços da gasolina e importante descontentamento popular. Foi assim que nasceu o primeiro movimento Occupy na África. No momento em que esses protestos começaram tomar ares revolucionários começou a diminuir o preço da gasolina.

No mesmo momento em que no ano passado estavam do lado da "primavera árabe", Barak Obama e Hillary Clinton não saudaram a luta democrática do povo nigeriano.

* Artigo publicado no jornal "Solidaire" do Partido do Trabalho da Bélgica.

http://www.horadopovo.com.br/2012/06Jun/3067-22-06-2012/P6/pag6f.htm

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