República Democrática do Congo: O que está por trás da escalada do conflito?
No centro está a luta imperialista pelas gigantescas riquezas minerais existentes na região, à qual se somou a entrada dos chineses a partir da década passada. A população é uma das mais miseráveis do mundo
Causa Operária - 23 de novembro de 2012
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Depois da ofensiva que começou em julho, o grupo guerrilheiro M23 tomou, no dia 19 de novembro, a cidade de Goma, capital da província de Kivu Norte, da RDC (República Democrática do Congo), ex Zaire, que tem um milhão de habitantes, na fronteira com Ruanda.
O M23, formado fundamentalmente por combatentes da chamada etnia tutsi, é uma continuidade do CNDP (Congresso Nacional para a Defesa do Povo), que operou na região até 2008, conta com o apoio dos governos de Ruanda e Uganda, e é um dos tantos grupos guerrilheiros que atuam no País. Após terem assinado a paz com o governo e terem permanecido no exército durante quatro anos, no passado mês de abril, em torno de 600 militares desertaram e fundaram o M23 (Março 23, em referência à data da assinatura da paz).
A força de intervenção militar das Nações Unidas (Monuc), que se encontra na região desde 2003, com o suposto objetivo de manter a paz, tem custado mais de US$ 1 bilhão por ano. sem conseguir controlar a situação e muito menos promover qualquer assistência para a população civil, exatamente da mesma maneira que tem acontecido no Haiti.
No centro do conflito está a luta pelo controle das gigantescas riquezas minerais existentes na região.
A RDC é o principal produtor africano de estanho (o quinto no mundo), o segundo de cobre, é responsável pela metade da produção mundial de cobalto e detém 80% das reservas conhecidas de coltano que é refinado como tântalo.
Calcula-se que na região tenham morrido vários milhões de pessoas nos últimos anos. Após ter sido o segundo país mais industrializado na África negra na década de 1960, a expectativa de vida hoje é de apenas 48 anos, uma de cada cinco crianças morre antes dos cinco anos de idade; 60% da população (70 milhões de pessoas) vive com menos de US$ 1,25 por dia.
Milhares de trabalhadores congoleses trabalham nas 200 minas da região em condições de semiescravidão. Os “minerais de sangue”, tais como estanho, ouro, tântalo e tungstênio chegam às mãos das multinacionais, principalmente as do setor de alta tecnologia, por meio do contrabando operacionalizado através de Ruanda e Uganda que, no sentido contrário, promovem o contrabando de armas para a RDC.
As manobras do imperialismo para manter o saque dos minerais
A situação geral dos regimes que sucederam a onda de movimentos de libertação nacional nos países da África negra têm um denominador comum – a formação de uma burguesia negra, regimes altamente corruptos, a enorme pobreza da maioria da população e a espoliação em larga escala dos vastos recursos minerais pelas multinacionais imperialistas.
Após a independência do antigo Congo Belga, em junho de 1960, as potências imperialistas continuaram intervindo ativamente para garantir o saque das riquezas. Em janeiro de 1961, os imperialistas belgas e norte-americanos sequestraram e assassinaram o herói da luta de independência Patrício Lumumba. Durante a década, incentivaram os conflitos étnicos e regionais. Junto com os imperialistas franceses, sob a máscara das Nações Unidas, continuaram intervindo e impuseram o sanguinário ditador Mobutu Sesse Seko, quem ficou no poder entre 1965 e 1997, além de ter suportado o regime hutu de Juvénal Habyarimana, em Ruanda, que promoveu o genocídio de 1994. Desde então, o exército de Ruanda invadiu a RDC três vezes. Em 1994, teriam morrido 800 mil pessoas.
Em 1997, Mobutu foi deposto por uma revolução que levou ao poder Laurent Désiré Kabila, pai do atual presidente, Joseph Kabila.
Em 1998, o governo tutsi de Ruanda, que tinha derrubado o regime hutu, promoveu uma escala militar contra os hutus que se estendeu à RDC e detonou a continuidade da guerra por cinco anos, onde estiveram envolvidos diretamente oito países africanos e 25 grupos guerrilheiros. Os exércitos de Angola, Tanzânia e República do Congo, assim como vários grupos guerrilheiros locais, apoiaram o governo da RDC. Os exércitos de Uganda e Ruanda se mantiveram na região oriental da RDC e, apesar dos pedidos das Nações Unidas pela retirada, continuaram recebendo empréstimos do Banco Mundial.
O governo de Joseph Kabila, que chegou ao poder após o assassinato do pai em 2001, conta com o apoio dos imperialistas franceses e belgas, assim como do governo chinês. Em 2002, assinou acordos de paz com Ruanda e Uganda.
Os governos de Ruanda, Uganda, Eritreia e Etiopia são importantes aliados dos imperialistas norte-americano e britânicos na região. As economias de Uganda e Ruanda dependem enormemente dos minerais contrabandeados da RDC, o que explica o apoio desses governos às várias das facções que têm se envolvido nas lutas pelo controle.
Há alguns meses, o governo Obama destinou pouco mais de uma centena de soldados a Uganda, como retribuição ao corrupto Yoweri Museveni, por ter enviado tropas para combater a guerrilha do al-Shabaab na Somália. É um início, mas evidencia o crescente objetivo de disputar de perto o controle das matérias primas, conforme a crise capitalista tem se aprofundado, dentro da estratégia militar do Africom (Comando dos EUA para África) e, no geral, do Pentâgono.
Devido à voracidade das multinacionais imperialistas, a RDC tem o apelido de “escândalo geológico”. Os acordos para espoliar as riquezas têm acontecido com qualquer um que as controlar, incluindo senhores da guerra e invasores, com o AFDL, de Kabila, Ruanda, o brigadeiro ugandês James Kazini e os guerrilheiros do RCD e do MLC, entre outros. Em apenas uma única transação, feita em maio de 1997, o AFDL recebeu US$ 50 milhões iniciais, mais US$ 200 milhões em quatro anos da Consolidated Eurocan Ventures, do Lundin Group de Vancouver, Canada, para permitir a exploração de minas de cobre e cobalto, num negócio avaliado em US$ 1,5 bilhões. Um seminário das Nações Unidas apontou 85 multinacionais que praticavam negócios ilegais na RDC, isso sem considerar o contrabando de armas, drogas e a lavagem de dinheiro.
A entrada dos chineses na disputa pelos recursos minerais
O governo chinês tinha aumentado enormemente a penetração no continente na última década com o objetivo de garantir o fluxo de matérias primas baratas à China, obras de infraestrutura, que incluem a exportação de contingentes de trabalhadores chineses, e o mercado de armas.
Em 2007, o governo da China assinou acordos com o corrupto governo de Kinshasa, capital da RDC, por US$ 9 bilhões, para investimentos em infraestrutura na RDC cujas cláusulas não foram feitas públicas, com o objetivo de facilitar o escoamento dos recursos minerais. Ainda não tem se materializado na região oriental devido aos conflitos.
China tornou-se o primeiro fornecedor de armas para os governos africanos. Seguindo o modelo aplicado no Sudão, tenta consolidar o governo da RDC e, principalmente o fraco exército, para proteger os seus interesses em crescimento. O avanço do controle das riquezas da província de Kivu representa uma ameaça para os ingressos fáceis de Ruanda, Uganda e as multinacionais imperialistas que se beneficiam diretamente do lucrativo esquema. Este é um dos fatores mais importantes que está por trás da recente escalada do M23 apoiado por Ruanda e Uganda.
O governo Chinês tem avançado sobre os recursos naturais africanos a partir da década passada, o que inclui farto crédito para pagar os projetos e produtos importados, na troca por recursos minerais, enquanto o imperialismo norte-americano tem ficado empantanado nas guerras do Afeganistão e do Iraque. A maioria dos trabalhadores dos empreendimentos são chineses e as condições de trabalho têm sido denunciadas como muito precárias – lembrar as revoltas dos trabalhadores em Zâmbia por exemplo. As empresas chinesas são responsáveis pela destruição em larga escala das florestas no Gabão, Camarões, RDC, Guinê Equatorial e Libéria.
Em 2004, foram investidos US$ 2 bilhões em Angola, que é um dos principais fornecedores de petróleo, reforçados nos últimos quatro anos por meio de vários outros acordos. Em 2006, foram US$ 6 bilhões em Gabão, destinados à produção de hidrelétricas, ferrovias e rodovias em troca de minério de ferro. Em 2009, US$ 7 bilhões para Guine e US$ 9 bilhões para Zimbabwe, entre outros. A maior parte dos investimentos chineses na África têm sido direcionados para a Nigéria, Angola, Etiópia e Sudão. No Sudão e Zimbawe representam em torno a 15% do PIB.
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