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Para compreender a pro-paga-n-da do ‘Estado (burguês) Profundo/Permanente’

por Eric Zuesse | Strategic Culture Foundation

Bacurau - 4 de dezembro, 2019

https://bbacurau.blogspot.com/2019/12/para-compreender-pro-paga-n-da-do.html


NOTA DOS TRADUTORES: “Estado Profundo” é a parte do Estado burguês que NUNCA MUDA, por mais que mudem as manifestações superficiais do Estado formal. ‘Estado Permanente’, portanto, é expressão muito mais interessante que ‘Estado Profundo’. Contudo, para facilitar a leitura, mas sem nos deixar prender numa arapuca semântica, enviesada, de classe, optamos pela notação “Estado Profundo/Permanente”.

Afinal de contas, o chamado “Estado Profundo” (burguês) é ruim por ser Permanente, inatingível pelos mecanismos e agentes da democracia, não importa quantas eleições aconteçam –, não por ser ‘Profundo’. De fato, essa autopropagandeada suposta ‘profundidade’ só lhe daria alguma ‘solenidade’ basilar, fundacional, que o Estado burguês permanente não tem. Daqui em diante, por algum tempo, adotamos a expressão “Estado Profundo/Permanente”. Algum dia haveremos de poder falar claramente de “Estado (burguês) Permanente”, até que seja extirpado.

Pelo sim, pelo não, como se verá no artigo aqui traduzido, o Estado dito Profundo pode até estar tentando emergir das profundezas, como meio de se autolegitimar, num processo jornalístico de massificação das opiniões. Deixará até de ser profundo, no sentido de oculto, invisível... mas continuará burguês e permanente, até que seja destruído.

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A propaganda é a própria vida do Estado (burguês) Profundo/Permanente.

O Estado Profundo/Permanente é o pequeno número de pessoas que controlam as organizações que doam a maior parte dos fundos que financiam as carreiras políticas de funcionários públicos, como presidentes, primeiros-ministros e membros dos Judiciários nacionais. Quase sempre, os membros desse Estado Profundo/Permanente são os acionistas controladores nas empresas internacionais que usam como quartel-general o território nacional de uma dada nação; e, portanto, o Estado Profundo/Permanente está sempre mais intensamente interessado em questões internacionais, que em questões puramente nacionais.

Dado que a maior parte dos membros do Estado Profundo/Permanente obtêm do exterior grande fatia da própria riqueza, eles precisam controlar as políticas exteriores de seus países de origem, ainda mais rigorosamente do que controlam as políticas domésticas de onde estejam. De fato, se não gostam das políticas domésticas da nação em que estejam, sempre podem simplesmente mudar de país. Mas realocar as operações das respectivas empresas sempre seria, para eles, muito mais difícil e caro. Além do mais, os cidadãos de cada nação sabem e interessam-se muito menos pelas políticas exteriores, do que pelas políticas domésticas de cada país; e, assim sendo, o Estado Profundo/Permanente reina virtualmente sozinho nas questões internacionais de todos os países. Basta ver como se definem as nações a serem tratadas como “aliadas” e as nações a serem tratadas como “inimigas”. Essas designações jamais são, pode-se dizer, determinadas pela opinião pública nacional em cada país. O povo apenas confia no que o governo declare sobre esses assuntos; por exemplo, no caso da alegação padrão do governo dos EUA, há décadas, de que “o Irã” seria “principal Estado patrocinador de terrorismo”, que é escandalosa mentira.

O Irã, claro, é a principal nação xiita do mundo, assim como a Arábia Saudita é a principal nação sunita do mundo; e a aristocracia norte-americana cultiva laços estreitos com Arábia Saudita e Israel, contra o Irã. Essa alegação contra o Irã sempre foi promovida pela família real proprietária da Arábia Saudita e também pelos bilionários que controlam Israel, tanto quanto pelos bilionários que controlam os EUA. Quer dizer: quem repete que o Irã seria “principal Estado patrocinador de terrorismo” é o Estado Profundo/Permanente, que controla pelo menos esses três países: EUA, Arábia Saudita e Israel.

Contudo, como já disse, essa acusação que o Estado Profundo/Permanente vive a repetir é falsa: dia 9/6/2017, publiquei “All Islamic Terrorism Is Perpetrated by Fundamentalist Sunnis, Except Terrorism Against Israel” [Todo o Terrorismo Islamista é Perpetrado por Sunitas Fundamentalistas, Exceto o Terrorismo contra Israel], e listei 54 ataques terroristas que tiveram grande destaque na mídia pró-EUA e aliada dos EUA no período 2001-2017, e todos aqueles ataques – exceto uns poucos, que foram ataques contra Israel –, foram perpetrados por grupos sunitas não ligados com o Irã.

Depois, o estudo de Kent R. Kroeger, de 16/5/2019 – “Is Iran the Biggest State Sponsor of Terrorism?” [Irã, maior estado patrocinador de terrorismo?] –, concluiu que uma enorme maioria dos ataques terroristas consumados desde 1994 foram serviço de grupos sunitas; mas incluiu entre esses os ataques dos Houthis xiitas do Iêmen contra a Arábia Saudita sunita, que Kroeger apresenta como ataques “terroristas”, mas foram, na verdade, resposta à guerra que os sauditas faziam com o objetivo de eliminar os Houthis no Iêmen. E Kroeger atribuiu aquelas ações dos Houthis ao “Irã” – o que é absurdo. (Os Houthis simplesmente não têm interesse em se deixar eliminar. E os EUA, claro, forneceram armas e planejamento militar para aquela tentativa de operação de limpeza étnica.) Há várias outras falhas de método. Mesmo assim, e apesar das falhas de método, Kroeger, concluiu, acertadamente, que

“A imagem distorcida do Irã, como país agressor que ameaça todo o Oriente Médio, é, dito com franqueza, propaganda enganosa: é noticiário forjado [ing. fake news].”

Aí está, em termos de credibilidade, o que vale o ‘noticiário’ distribuído pelo Estado Profundo/Permanente.

A expressão “noticiário forjado” [fake news] é de fato enganadora (ou é, ela mesma, noticiário forjado), em todos os casos em que não designe e discuta diretamente a “propaganda pró-Estado (burguês) Profundo/Permanente”.

Em meu artigo de 27/11/2017 “How the US Came to Label Irã the Top State Sponsor of Terrorism” [Como os EUA Conseguiram Colar no Irã o Rótulo de Principal Estado Patrocinador do Terrorismo], descrevi especificamente a operação do Estado Profundo/Permanente que criou a frase “Irã é o principal estado patrocinador do terrorismo”. Mas verdade é que esse é o modo como o Estado Profundo/Permanente opera, rotineiramente, em todas as questões internacionais: por mistificação, por fraude e burla. Assim obtém o consentimento popular e consegue que o próprio Estado Profundo/Permanente efetivamente governe. É ideia perfeitamente consistente com a constatação científica segundo a qual os EUA são estado ditatorial, não algum tipo de democracia. Todas as provas convergem nessa direção.

O Estado Profundo/Permanente de que aqui se trata é o Estado dos EUA e seus Estados aliados; não é simples organização nacional. Constitui-se principalmente de bilionários norte-americanos, plus bilionários em países aliados dos EUA, como Reino Unido, França, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Israel —, mas também em muitos outros países (inclusive, por exemplo, bilionários nacionais de Honduras, do Brasil,[1] etc.). No total, são menos de 2.000 pessoas, e fazem negócios juntos, e os contatos entre eles são tanto pessoais, diretos, pessoa-a-pessoa, como indiretos, mediante representantes ou agentes.

Mas os bilionários norte-americanos lideram o Estado Profundo/Permanente de EUA & Aliados. Significa dizer que os líderes desse Estado Profundo/Permanente são 607 bilionários norte-americanos que são os principais financiadores de campanhas eleitorais nacionais e de candidatos locais nos EUA. – Esses 607 indivíduos determinam quem terá uma chance de se tornar presidente ou membro do Congresso dos EUA, e quem jamais chegará lá. Por exemplo: esses indivíduos nem sempre selecionam o/a político/a que será presidente dos EUA, mas, sim, sempre selecionam todos os que terão a chance de se apresentar como sério candidato/candidata àquela posição. (Basicamente, o mesmo que os mulás fazem no Irã, esses super-ricos fazem nos EUA: no Irã, pelas regras do clericato islamista; nos EUA, pelas regras da aristocracia do dinheiro.)

Um desses bilionários é George Soros, e discutem-se adiante as ideias e posições de um dos muitos cuja carreira política Soros patrocina. Outro desses bilionários é Charles Koch,[2] do qual não se tratará aqui; nos EUA ele é considerado em geral ‘inimigo’ de George Soros, mas só porque os dois têm ideias opostas em questões nacionais dos EUA.

(Bilionários tendem a se preocupar mais com, e a unir-se mais firmemente em torno de, temas internacionais, que em torno de questões domésticas, embora sempre se oponham em uníssono a quaisquer impostos e a qualquer regulação de impostos. São pregadores empenhados a favor de ‘livres mercados’, isso sim; sejam nacionais sejam internacionais. E também sempre apoiam que se imponham sanções econômicas contra países que se recusem a ser controlados por eles. Mas de fato, na vida real, só defendem alguns livres mercados, não todos. Dito de outro modo, só defendem os livres mercados que favoreçam o acúmulo de poder para eles mesmos, o que implica dizer que buscam construir oligopólios; e que absolutamente não favorecem nenhuma modalidade de livre concorrência.)

Há mais semelhanças que diferenças entre os dois homens citados acima, e ambos representam o que se conhece como “neoliberalismo” – a ideologia universal dos bilionários, ou, pelo menos, de todos os bilionários que investem em candidaturas a postos de governo ou nos legislativos nacionais.

São raros os bilionários que não investem em candidaturas de políticos; e, embora haja discordâncias entre políticos em vários campos, praticamente todos os políticos candidatos a seja o que for são, hoje, neoliberais, porque, se não o forem, os bilionários do Estado Profundo/Permanente não investirão neles.

As políticas exteriores dos neoliberais são chamadas “neoconservadoras”, o que significa que apoiam os mais variados processos para “mudar regimes” em qualquer país que os bilionários decidam que seja nação “inimiga”. Assim sendo, o “neoconservador” é praticamente um braço político do “neoliberal”. O neoconservador trabalha para levar o neoliberalismo a outros países; é internacionalmente agressivo; é o neoliberalismo imperialista. É fascista, mas, quanto a isso, o próprio neoliberalismo já é fascista.

A diferença entre neoliberalismo e neoconservadorismo é que o neoconservadorismo é uma extensão imperialista do fascismo, é o fascismo imperialista que, na 2ª Guerra Mundial, foi representado pelas três potências do Eixo – Alemanha, Itália e Japão. A Espanha era meramente neoliberal, mas o Eixo era também conservador (neoliberais expansionistas). Os Aliados, na 2ª Guerra Mundial lutaram contra precisamente tudo isso.

Fato é, contudo, que hoje os EUA emergiram como o regime neoconservador líder no mundo, que invade e ocupa país após país, nenhum dos quais jamais invadiu nem algum dia ameaçou invadir os EUA. Nesse quadro, a propaganda torna-se absolutamente necessária, indispensável para ‘justificar’ invasões e ocupações. Esse artigo visa a mostrar como isso é feito.

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O Estado Profundo/Permanente pouco tem a ver com questões nacionais domésticas, porque virtualmente todos os seus membros controlam corporações internacionais, e o Estado Profundo/Permanente opera quase exclusivamente em questões internacionais: políticas exteriores dos países, diplomacia, questões militares e agências internacionais de espionagem chamadas “agências de inteligência” – para a extensão do império. O Estado Profundo/Permanente controla tudo isso, independente de que partido esteja no poder. (O público em geral dá pouca atenção à política exterior e acredita no que o governo diz, quando diz que a “segurança nacional” teria a ver com proteger os cidadãos, não com expandir o poder e a riqueza dos bilionários.)

A ditadura do Estado Profundo/Permanente norte-americano é realmente mais internacional que nacional; garante a continuidade nas relações internacionais, ao escolher e definir quais nações (quais governos estrangeiros) são “aliados” (o que significa “venderemos armas para eles”) e quais são “inimigos” (o que significa “temos de lhes impor sanções e talvez até de os bombardear”). Os dois tipos, aliados e inimigos, são essenciais para que o Complexo Militar-Industrial-Jornalístico-Governamental, CoMIJoG [ing. Military-Industrial-Press-Government Complex, MIPGC) prospere; e o Estado Profundo/Permanente controla todo o CoMIJoG. Em outras palavras: o Estado Profundo/Permanente é um poder internacional e, como tal, sua máxima aspiração é destruir, para conquistar (mediante subversão, sanções, golpes e/ou invasão), todos os países que o próprio Estado Profundo/Permanente rotule de “inimigos”.

Pelo modo como o Estado Profundo/Permanente vê as coisas, não é necessário que algum ‘inimigo’ tenha ameaçado ou invadido os EUA para que seja “inimigo”, porque os EUA e seus aliados teriam um direito a eles outorgado por Deus, para impor sanções contra seja quem for e para organizar golpes para derrubar governos de qualquer país, desde que alguém tenha algum dia dito ou escrito que o tal país seria ‘uma ditadura’ ou que teria ‘violado direitos humanos’, ou feito qualquer das coisas que o próprio Estado Profundo/Permanente norte-americano fez e faz realmente mais frequentemente que qualquer outro governo do planeta (e, sobretudo, que fez e faz sempre contra os seus mesmos ‘inimigos’ seletos – a saber, Iraque, Líbia, Síria, Irã, Venezuela, e qualquer outro país que seja amigo ou, seja como for, seja ou pareça aliado da Rússia, que é a outra superpotência nuclear e alvo central do Estado Profundo/Permanente).

Contudo, embora esses poucos indivíduos super-ricos paguem por todas as suas operações (além de extrair impostos e taxas dos cidadãos em geral), os seus muitos agentes e operadores são fieis, crentes, no sentido religioso do termo (creem no neoliberalismo neoconservador), e essa é a razão pela qual os mestres sentem-se seguros para alimentar com muito dinheiro as carreiras desses indivíduos. Pela mesma razão, os patrões proveem as plataformas e as conexões pessoais e os empregos que capacitam os seus fiéis seguidores a progredir e prosperar em postos nos quais tenham poder para influenciar governos, países e massas, enquanto os oponentes do Estado Profundo/Permanente (i.e., os que se oponham à ditadura coletiva dos bilionários) não encontram nenhum bilionário interessado em garantir-lhes sequer o sustento.

Em sociedades que mantêm a riqueza extremamente concentrada em mãos de poucos, não contar com o dinheiro dos mesmos poucos significa miséria, virtual penúria, para todos que se oponham à ditadura coletiva dos bilionários. Sobretudo os políticos candidatos aos mais altos cargos precisam de padrinhos aristocratas – os bilionários –, se querem ser bem-sucedidos na carreira eleitoral.

O beneficiário do Estado Profundo/Permanente que usaremos aqui como exemplo, que citaremos e cujo caso discutiremos, é Jacek Rostowski, também conhecido como Jan Anthony e como Jan Anthony Vincent-Rostowski. O artigo da Wikipedia (ing. aqui traduzido) sobre ele começa assim:

Desde 1995 é professor de Economia e foi chefe do Departamento de Economia na Universidade Centro-europeia em Budapeste nos períodos 1995-2000 e 2005-2006. [9]

Carreira posterior [editado]

Rostowski foi membro do Partido Conservador Britânico. No início de 2010, foi anunciado que dois meses antes se tornara membro do partido Plataforma Cívica [ing. Civic Platform (PO)]. Nas eleições parlamentares de 2011, foi eleito ao Parlamento, na lista do Partido Plataforma Cívica. [16]

No final de 2015, a primeira-ministra Ewa Kopacz nomeou Rostowski como seu principal conselheiro político. [17]

Vincent-Rostowski publicou cerca de 40 artigos acadêmicos sobre promoção europeia, política monetária, questões de moeda e a transformação das economias pós-comunistas. É autor de livros acadêmicos, dentre os quais Macroeconomic Instability in Post-Communist Countries [Instabilidade macroeconômica em países pós-comunistas], publicado pela Oxford University Press.

Dia 3/11, a revista ucraniana de ‘notícias’ Apostrophe o entrevistou e publicou a entrevista em ucraniano. (O entrevistado não é fluente em ucraniano, mas o tradutor para o ucraniano não é citado.) O que adiante se lê é tradução ao português, de uma tradução ao inglês, daquele original em ucraniano [NTs].

A página “Sobre a revista”, em inglês, do site Apostrophe diz:

Apostrophe começou em agosto de 2014.

O site visa a preparar material informacional e analítico, apresentações de eventos importantes em política, economia, sociedade e cultura. A política editorial de Apostrophe baseia-se em princípios de imparcialidade, precisão e veracidade, rapidez, objetividade e equilíbrio na apresentação da informação. Apostrophe adere aos padrões éticos do jornalismo. Por isso materiais publicados não devem propagar violência, crueldade, ou causar ódio racialista, nacionalista ou religioso. Apostrophe propõe os valores comuns do humanismo, com paz, democracia, progresso social e direitos humanos.

O projeto funciona com a participação direta e o uso dos recursos do International Centre for Policy Studies, ICPS [Centro Internacional para Estudos Políticos]. A ideia de Apostrophe posiciona-se no quadro de sinergia entre jornalistas e analistas.

Na página “Sobre nós” do International Centre for Policy Studies (ICPS), lê-se:

ICPS foi fundado em 1994 por iniciativa do Open Society Institute (OSI) [Instituto Sociedade Aberta], com sede em Praga. Naquele momento, o ICPS era o primeiro think-tank independente em toda a Ucrânia.

O Instituto Sociedade aberta foi fundado por George Soros. O mesmo George Soros também fundou a Central European University [Universidade Centro-europeia] em Budapest, da qual o entrevistado foi empregado por cinco anos.

Esses são só as vias visíveis mais óbvias pelas quais o entrevistado recebeu fundos e promoções do Sr. Soros.

Soros também ajudou a financiar a derrubada do presidente da Ucrânia, em 2014, democraticamente eleito e internacionalmente não alinhado [aos EUA] e sua substituição por um regime nazista anti-Rússia que opera como valiosíssimo quadro a favor do Estado Profundo/Permanente de EUA e aliados, porque a Ucrânia tem 2.615 km de fronteiras com o país que o regime instalado pelos EUA na Ucrânia mais odeia: a Rússia (odeia porque o Estado Profundo/Permanente de EUA e aliados anseia, sobretudo, por conseguir controlar também a outra superpotência nuclear; aqui se fala portanto de ódio ‘em obediência a ordens superiores’).

Um pressuposto básico daquela entrevista, tanto no entrevistador como no entrevistado, é que o governo russo erraria sempre, absolutamente, tudo; e que o governo ucraniano – o regime que Obama (outro dos beneficiários dos fundos do Sr. Soros) instalou no poder — acertaria sempre, absolutamente, tudo.

Adiante lê-se a entrevista, que aí vai como exemplo claro do tipo de ‘análise’ que resulta da propaganda política produzida e distribuída por ‘especialistas’, que não passam de profissionais treinados para ações de propaganda (ORIGINAL DO ARTIGO, em ucraniano em https://apostrophe.ua; aqui retraduzido do inglês ao português, NTs).

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Apostrophe: Como o senhor descreve o estado atual da segurança na região europeia?

Jan Anthony: Gestão de conflitos e resolução de conflitos são coisas diferentes. O que vejo hoje são esforços para criar contexto mais positivo na questão do Donbass. Precisamos voltar aos acordos de Minsk como uma resolução básica para o conflito. Como o senhor sabe, as discussões estão em andamento pela chamada fórmula Steinmeier. Assim sendo, há hoje uma oportunidade para voltar à discussão de como os acordos de Minsk devem ser implementados. Há questões sérias sobre a sequência de pontos – o que deve ser feito em primeiro lugar. E há também a questão de como confirmar que as partes cumpram as respectivas obrigações assumidas, porque hoje o nível de confiança entre os participantes é muito baixo. Portanto, para tudo que se faça é necessário demonstrar que se cumpre o que seja decidido.

Apostrophe: E quanto à implementação de Minsk? Principalmente considerando que não se trabalha nisso há quase cinco anos.

Jan Anthony: No meu modo de ver, ninguém está discutindo hoje quaisquer alternativas. Talvez, entre as pessoas que estão discutindo meios para implementar os acordos, haja outras opções, mas não tenho ideia de que opções possam ser. Os acordos de Minsk continuam em foco.

Apostrophe: Falemos sobre a Crimeia. Que ameaças pesam sobre a península?

Jan Anthony: Com a Crimeia a história é diferente do que se tem com o Donbass. Na Crimeia há instalações que podem ser usadas como base para armas nucleares russas, inclusive para a Marinha russa, que pode transportar armas nucleares no Mar Negro.

NOTA IMPORTANTE: A ação do governo Obama na Crimeia visou, originalmente, a tomar a base naval russa na Crimeia para ali instalar base naval norte-americana ainda maior que a base russa, contra a Rússia.]

Apostrophe: Quer dizer que a principal ameaça são armas nucleares?

Jan Anthony: Claro, é ameaça extremamente séria pela sua própria natureza. Qualquer uso de armas nucleares seria desastroso.

Apostrophe: O Kremlin pode decidir usar essas armas em futuro próximo? Ou é apenas um modo de intimidar o Ocidente?

Jan Anthony: O objetivo primário de armas nucleares é a contensão. Esse é o principal objetivo com vistas ao qual a Rússia instalou armas nucleares na Crimeia.

Apostrophe: É possível comparar essa situação e a crise cubana?

Jan Anthony: Não diria que sejam situações similares. Naquele caso a situação chegou muito, muito perto de escalar para conflito armado. Não me parece que chegaremos àquele nível de confronto.

[NOTA IMPORTANTE: Ambos, entrevistador e entrevistado não comentam a evidência de que, diferente da União Soviética que em 1962 tentava instalar mísseis nucleares na ilha de Cuba, a 152 quilômetros da fronteira dos EUA, os EUA agora conspiram para instalar mísseis nucleares exatamente sobre uma fronteira de 2.615 quilômetros com a Rússia. Ao não marcar essa evidência, entrevistador e entrevistado invertem a ameaça real. Assim insultam a inteligência dos leitores, além de insultarem também a inteligência um do outro.] Segue a resposta:

Mas a situação atual é muito perigosa. A comparação com a situação da crise cubana deve ajudar-nos a encontrar mecanismos mais estáveis a serem desenvolvidos agora.

Apostrophe: Como o Ocidente pode forçar a Rússia a retirar suas armas da Crimeia?

Jan Anthony: As sanções, é claro, tiveram efeito. Tenho certeza de que serão mantidas. Não vejo qualquer razão para retirar as sanções. A pressão internacional continuará sobre a Rússia. É impossível normalizar relações com a Rússia, enquanto permanecer a situação que temos hoje na Crimeia. E dado que a Rússia não tem intenção de deixar a Península, viveremos por longo tempo em um difícil relacionamento com os russos, com sanções e contando com a pressão de países ocidentais, sempre obrigados a considerar a possibilidade de confronto militar.

Apostrophe: Lembremos o ataque a navios militares ucranianos no Estreito de Kerch, que aconteceu há quase um ano. Como podemos evitar a ameaça de outros ataques russos a navios ucranianos e de outros países?

Jan Anthony: A Ucrânia perdeu controle sobre parte da própria navegação, bem como o acesso seguro ao Mar de Azov — e esse é problema complexo. A questão deve ser objeto da atenção internacional. A Ucrânia deve ter acesso às águas e poder atuar em operações comerciais nos portos. A Geórgia enfrentou o mesmo problema – perder o controle sobre a navegação numa certa área. Faz falta um mecanismo especial para resolver essas questões. Mas não tenho nada a sugerir.

Apostrophe: A Rússia recentemente bloqueou águas internacionais no Mar Negro, fechando rotas comerciais. Como a comunidade internacional deve responder a esse comportamento?

Jan Anthony: Temos de respeitar a Convenção Internacional sobre Navegação. Temos de continuar a fazer exercícios militares no Mar Negro e é importante que países da OTAN participem daqueles exercícios. Claro, permanece o risco de que a Rússia também organizará seus próprios exercícios. Acho que as embarcações gozarão do direito à liberdade de navegação estabelecido na Convenção Internacional. Algumas questões podem exigir discussões mais amplas, com vistas a uma futura convenção para o longo prazo. Precisamos dar mais destaque às exigências de segurança. É importante revisar os limites de tempo de permanência de navios da OTAN, no Mar Negro. Os planos da OTAN para defesa e contensão também têm de ser modificados. A OTAN precisa ter garantido maior acesso ao Mar Negro, e suas forças navais devem poder permanecer lá por mais tempo.

Apostrophe: E considera-se, nessa a necessidade de renegociar acordos internacionais, a fragilidade das instituições internacionais e o grave despreparo para enfrentar ataques russos que se constatam hoje?

Jan Anthony: Muitos países entraram em acordos bilaterais com a Rússia, para garantir a própria segurança ao usar os mares. Acho que esses acordos têm de ser modernizados, e que é preciso construir um outro acordo, que crie efetivamente um mecanismo para discutir incidentes marítimos, baseado em organizações internacionais, por exemplo, sob o guarda-chuva da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE). Assim se evitarão mal-entendidos que surjam quando as regras forem desrespeitadas.

No caso de violações deliberadas, por exemplo, quando manobras militares bloquearem parte do Mar Negro, será preciso usar outras medidas de punição. E nesse caso, é preciso que a comunidade internacional se manifeste com clareza. Se se analisa a Cúpula da OTAN de 2014 em Bruxelas, ficou decidido que haverá resposta dura no caso de qualquer crise. A única questão é o que fazer da Ucrânia, que não é membro da Aliança e não obedece suas decisões.

Apostrophe: Quanto ao poder militar russo. Durante as manobras Grom-2019, realizados recentemente sob comando pessoal de Vladimir Putin, o submarino cruzador nuclear K-44 Ryazan disparou apenas um míssil balístico intercontinental R-29R. O outro míssil permaneceu no silo. Não é o primeiro fracasso do exército russo. Assim, a questão é inevitável: a Rússia é mesmo ameaça real à paz? O que vimos até aqui é só uma amostra?

Jan Anthony: A Rússia pode resolver o problema que você identificou. E não há dúvidas de que possui arsenal nuclear extremamente poderoso. Apesar de alguns problemas com algumas armas, a Rússia ainda é muito forte.

Apostrophe: O Kremlin prometeu desenvolver mísseis de curto e médio alcance e usá-los para confrontar o Ocidente. De fato, até já fez isso, com a fabricação dos Iskanders). Significará que a situação atual na Europa aproxima-se do que tínhamos na Guerra Fria, quando a União Soviética e o Ocidente instalaram mísseis balísticos intercontinentais para mútua contensão?

Jan Anthony: Sim, a Rússia já desenvolveu e instalou mísseis balísticos intercontinentais. Não sabemos se são equipados com ogivas nucleares. Mas para preservar o equilíbrio de poder, a OTAN precisa construir força significativa, armada com recursos nucleares.

Há diferenças em relação à Guerra Fria. Naquele momento havia completa separação e nenhum contato entre Leste e Oeste. E hoje temos significativa cooperação econômica. Ainda é possível manter discussões políticas, inclusive com a participação de organizações intergovernamentais. Assim sendo, a situação não é a mesma que tínhamos durante a Guerra Fria. Mas, como já disse, a situação de segurança na Europa é muito difícil, e as relações com a Rússia estão em deterioração. É preocupante a ausência de sinais de que a deterioração esteja regredindo. Não se veem meios efetivos pelos quais melhorar as relações com a Rússia. Mudaram, portanto, as razões para preocupação.

Apostrophe: O Kremlin enviou a divisão S-400 e a bateria Panzir-S para a Sérvia para as Forças Aéreas de Defesa Aérea. De fato, são exercícios militares russos próximos da União Europeia.

[NOTA IMPORTANTE: O problema não é que a Rússia estivesse movendo-se para muito perto da União Europeia – como entrevistador e entrevistado acima deixam implícito –, o que não está. O problema é, isso sim, que a OTAN moveu-se diretamente na direção das fronteiras russas. Mais uma vez, a presunção insulta a inteligência básica dos leitores – e/ou também a inteligência de entrevistador e entrevistado.]

Apostrophe: Estará em preparação um ataque contra o ocidente?

Jan Anthony: A posição da Sérvia é que querem ter boas relações com seus vizinhos países da OTAN, mas também com a Rússia. A Sérvia também está treinando com países da OTAN. A Sérvia quer um equilíbrio de poder, mas no evento de um conflito, o país apoiará os membros da União Europeia. Está relacionado politicamente e economicamente com países ocidentais. Assim sendo, não creio que esses exercícios sejam o Kremlin em preparação para atacar a União Europeia.

Apostrophe: Como o senhor avalia as ameaças militares contra a Europa, na Ucrânia, Belarus e Moldávia?

Jan Anthony: É difícil responder, porque são três países diferentes e a situação em cada um deles é completamente diferente dos demais.

Ucrânia e Moldávia têm situações similares. Soldados russos permanecem na Transnistria – a única diferença é que o conflito ali está congelado.

Sim, está lá, mas não lutam como na Ucrânia.

Apostrophe: O senhor acredita que esse conflito congelado pode continuar?

Jan Anthony: Hoje não cremos que seja muito provável.

Apostrophe: A Europa espera um ataque militar dos russos?

Jan Anthony: Não, não esperamos isso. Mas não descartamos completamente em nossos planos de defesa. Há preparações em curso para esses ataques, o que significa que existe possibilidade reduzida.

Apostrophe: A Rússia investe pesadamente em partidos políticos europeus como a Frente Nacional Francesa ou a Liga do Norte italiana. Há alguma evidência de que o Kremlin está investindo em ‘milícias’ em países europeus e fornecendo armas à Europa para agitar a situação. Pode talvez estar financiando atividades criminosas para influenciar a situação na União Europeia?

Jan Anthony: Há muitas investigações sobre relações com o Kremlin, em particular, laços financeiros de políticos. A União Europeia, UE discute grande número de ciberameaças, a possibilidade de ataques à infraestrutura, assim como ataques de informação. Mas nunca vi o Kremlin fornecer armas a organizações não estatais, especialmente a grupos criminosos.

Apostrophe: A Rússia assumiu a resolução da questão na Síria. Como estão as coisas agora, por lá?

Jan Anthony: Oficialmente, a Rússia está ajudando as forças de Bashar al-Assad a ganhar controle sobre o território sírio. Mas o que está acontecendo agora, do ponto de vista do Kremlin, a formação de um único espaço estratégico, incluindo o Mar Negro e o Mediterrâneo ocidental. A Rússia tem livre acesso ao Mar Negro, e agora a Marinha Russa obteve muito maior acesso às águas do Mediterrâneo oriental. Planejam usar esse espaço estratégico para um possível confronto com as forças da OTAN.

Apostrophe: Como isso pode afetar a Europa?

Jan Anthony: É pergunta muito difícil. Uma questão que preocupa é o influxo de refugiados e de pessoas temporariamente deslocadas para a Turquia e a Europa. Por outro lado, outra vez, a criação, pela Rússia, de um único espaço estratégico no Mediterrâneo.

Apostrophe: Voltemos à Ucrânia. Você é especialista em segurança nuclear. Temos muitas usinas nucleares. Os russos podem ser ameaça para o mundo, no caso de agressão em grande escala?

Jan Anthony: Sim, essa é uma ameaça muito grande, em primeiro lugar ameaça a própria Ucrânia; depois, ameaça o resto do mundo. Um funcionário do estado ucraniano disse que essa é a razão para que se revise amplamente o conceito de segurança da Ucrânia. Inclui as ameaças supostas internas a equipamento nuclear e a criação de proteção e defesa dos reatores nucleares. Acho que a ameaça à infraestrutura da usina nuclear na Ucrânia é real. Mas o governo ucraniano está levando a ameaça a sério e tomando as medidas necessárias. [Fim do artigo aqui citado.]

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ARREMATE:

Como pode-se ver claramente nesse exemplo, o método básico dos propagandistas do Estado Profundo/Permanente é fazer perguntas nas quais se tomam falsidades, como se fossem fato; e respondê-las de modo que confirma as mentiras, como se fosse verdade. Esse, precisamente, é o serviço que milhões de pessoas são pagas para prestar. Assim se cria aqui [nos EUA e nos ‘estados aliados’] um “Big Brother” ou o Estado (burguês) Profundo/Permanente, como George Orwell, em 1948, pensou em 1984 que provavelmente aconteceria.

“Graças a Deus, existe o ‘Estado Profundo’!”

Vê-se aqui [How the Deep State ‘Justifies’ Itself in America/Como o Estado Profundo se ‘autojustifica’ nos EUA, Eric Zuesse, Strategic Culture Foundation, 6/11/2019 (ing.)] um bom exemplo de como o Estado Profundo/Permanente já está ‘autojustificado’ nos EUA:

“Dia 30 de outubro, houve um debate público promovido pelo National Press Club e o Michael V. Hayden Center, transmitido por C-Span. Os debatedores eram John Brennan, Michael McCabe, John McGlaughlin e Michael Morrell.

Todos concordaram com o que disse McLaughlin (ex-vice-diretor da CIA) “Graças a Deus, existe o ‘Estado Profundo’!”, e o grande público que assistia ao debate também aplaudiu. Ninguém vaiou McLaughlin. John Brennan insistiu no mesmo tema, repetiu a frase, ampliou e aprofundou a ideia, e recebeu ainda mais aplausos. Mas a ideia não foi inventada por McLaughlin, nem nascia ali.

Já pelo menos desde 2017 está em andamento o processo de construir a justificação pública do Deep State norte-americano para o público dos EUA. O tema tem aparecido repetidamente nas páginas do New York Times, como “b”, que anima o blog Moon of Alabama observou corretamente em outubro de 2019:

“Desde que Donald Trump foi eleito presidente, o modo como o New York Times interpreta o ‘Estado Profundo/Permanente transformou-se, de total negação de que existisse, para irrestrito apoio às suas operações contra a democracia.”

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NTs

[1] Sobre bilionários no Brasil-2019, ver, interessante, “Bilionários Brasileiros”, na revista Forbes, setembro de 2019, matéria recomendada pelo professor Ladislau Dowbor, em entrevista à TV 247, em https://www.youtube.com/watch?v=AxMQHWilWHs [NTs]

[2] Sobre os “irmãos (David, falecido em agosto de 2019, aos 79 anos e Charles) Koch”, ver, interessante: “Os irmãos bilionários que comandam a guerra contra Obama. Sobre operações ONG-‘midiáticas’-eleitorais”, 30/8/2010, Jane Mayer, ing. em The New Yorker; e port. em redecastorphoto) [NTs].

Traduzido por Coletivo de tradutores Vila Mandinga

Eric Zuesse é historiador investigativo e autor de They’re Not Even Close: The Democratic vs. Republican Economic Records, 1910-2010 e CHRIST’S VENTRILOQUISTS: The Event that Created Christianity.

https://bbacurau.blogspot.com/2019/12/para-compreender-pro-paga-n-da-do.html


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