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Irã impõe suas Regras de Engajamento: “Olho por olho”

por Elijah J Magnier | ejmagnier.com

O Empastelador - 25 de julho, 2019

https://oempastelador.blogspot.com/2019/07/ira-impoe-suas-regras-de-engajamento.html


O estreito de Ormuz ou Hormuz é um pedaço de oceano relativamente estreito entre o golfo de Omã ao sudeste e o golfo Pérsico ao sudoeste. Na sua costa norte está o Irã e na costa sul os Emirados Árabes Unidos e um enclave de Omã.

Nos últimos meses, o Irã selecionou meticulosamente seus passos políticos e seus alvos militares, ambos no Golfo e na arena internacional. A retirada parcial e gradual – tática, mas legal – do Plano Amplo para Ação Conjunta (ing. JCPOA), também conhecido como “o acordo nuclear”, segue uma trilha determinada. O objetivo claro desses movimentos é encurralar o presidente dos EUA e seus aliados europeus, e o Irã parece mesmo visar a uma completa retirada do JCPOA. Além disso, apesar do efeito que as sanções dos EUA estão tendo sobre a economia iraniana – e apesar da determinação do Irã em rejeitar a hegemonia dos EUA – autoridades iranianas dispensaram publicamente o oferecimento dos russos dispostos a apoiar as vendas de petróleo iraniano.

No Irã, fontes confirmam que

“A China rejeitou as sanções dos EUA, e a Rússia ofereceu-se para vender 1 milhão de barris de petróleo iraniano por dia, e substituir o sistema financeiro europeu por outro, sendo necessário. Mas por que o Irã facilitaria as coisas para os mesmos que assinaram o acordo (a Europa)? Se os países europeus estão divididos, se não estão em posição de honrar o acordo, por que, para começar, assinaram o acordo? O Irã vai-se retirar gradualmente, como estabelece o acordo nuclear, até uma retirada completa.

O Irã enfrenta uma recessão (Trump será provavelmente reeleito, o que prolongará a recessão), mas não está na miséria e está longe de estar economicamente e politicamente de joelhos.”

Apesar das duras sanções impostas pelos EUA, o Irã está enviando sinais pouco usuais e paradoxais, rebaixando o efeito da crise econômica e mostrando o quanto as medidas do governo Trump são bem pouco significativa: congelou o oferecimento dos russos, concebido para aliviar as dificuldades financeiras mediante a venda diária de um milhão de barris de petróleo iraniano, e a possibilidade de operar um sistema que substitua o sistema financeiro europeu. A única interpretação plausível é que o Irã esteja decidido a se retirar do acordo nuclear, se possível ser atrair sobre si sanções universais. Paralelamente, os passos militares dos iranianos avançam em ritmo calculado.


Imagem: Barcos da Marinha do Corpo de Guardas da Revolução Islâmica navegam em círculos em torno do navio-tanque Stena Impero, de bandeira britânica, para obrigá-lo a reduzir a velocidade, antes de ser abordado por Forças Especiais do Irã.

Nenhum dos vários objetivos militares atingidos nos últimos meses foi acaso ou resposta impulsiva, a começar pela sabotagem de al-Fujeirah, seguida pelos ataques com drones a estações de bombeamento da Aramco, até os danos provocados num navio-tanque japonês. O Irã não reivindicou oficialmente a primeira ação. A segunda foi reivindicada pelos Houthis no Iêmen. A terceira teve por alvo um navio-tanque japonês e o atacante continua foragido, oficialmente desconhecido.

Mas o Irã veio a público para anunciar que derrubara um drone norte-americano de vigilância e que capturara um navio-tanque britânico no Golfo de Omã. O navio foi forçado a navegar para o porto iraniano de Bandar Abbas. Cada uma das reações dos oponentes do Irã foi antecipada e calculada pelo Corpo de Guardas da Revolução Islâmica (ing. IRGC); cada um dos ataques foi executado com esmero, e sua preparação foi perfeitamente planejada. Mas isso não significa que o Irã não leve em conta um possível cenário de guerra, quando potencialmente haverá mísseis voando em todas as direções. O Irã está provocando, respondendo e até jogando com as ameaças de guerra que lhe fazem Trump e Netanyahu, caminhando na beira do abismo.

Muitos líderes iranianos têm repetido a mensagem bem clara: se não podemos exportar petróleo, ninguém exportará. Está também dizendo aos países vizinhos que qualquer tentativa deles para exportar seu petróleo pelo Estreito de Ormuz será contida, daí os ataques a al-Fujeirah (aos Emirados Árabes) e à Aramco (estatal petroleira da Arábia Saudita). Nos dois casos, vias substitutas potenciais para exportar petróleo do Oriente Médio sem ter de passar pelos estreitos controlados pelo Irã.

O Irã escolheu derrubar um drone pilotado à distância, mesmo podendo derrubar um avião espião dos EUA com 38 oficiais a bordo. O mesmo presidente dos EUA – que se pôs em posição embaraçosa ao não reagir à derrubada do drone – foi obrigado a agradecer ao Irã por não ter derrubado o avião espião, com pessoal norte-americano a bordo. Foi decisão planejada com mão de mestre na liderança do IRGC, operando entre alternativas duríssimas.

Trump pode justificar a falta de reação com o argumento de que não houve perdas humanas; com certeza sabe que qualquer atrito militar pode fazer gorarem suas chances de reeleição: fator que o Irã calculou muito atentamente. A opção por uma guerra limitada não foi deixada aberta para Trump.

Mais importante que isso, depois que os Marines Reais do Reino Unido pousaram em helicópteros sobre o super navio-tanque petroleiro iraniano “Grace 1” para capturá-lo – e apesar de nem Irã nem Síria serem membros da União Europeia e, assim, não serem alvos legítimos para sanções a serem aplicadas e validadas nesse caso –, o Irã, antes, deu chance ao enviado francês Emmanuel Bonne para que encontrasse uma saída para a crise. Mas poucas horas depois de o Reino Unido ter decidido que manteria preso por mais um mês o “Grace 1”, Forças Especiais Iranianas do Corpo de Guardas da Revolução Islâmica capturaram – servindo-se de estilo “corta-cola” de abordagem– o navio britânico “Stena Impero”, no exato momento em que o governo britânico estava muito fragilizado, e a primeira-ministra do Reino Unido estava a poucos dias de deixar o cargo. Mais uma vez, operação muito cuidadosamente planejada, com preciso cálculo de riscos.

Os EUA empurraram o Reino Unido para que agisse contra o Irã, mas ficou de lado, apenas assistindo à humilhação do ex-“Império Britânico” que indiretamente dominou o Irã durante a era do Xá, antes de o Imã Khomeini chegar ao poder em 1979.

O Irã tomou o navio petroleiro do Reino Unido no Golfo de Omã, sob um pretexto medíocre, equivalente ao pretexto dos britânicos quando capturaram o “Grace 1” em Gibraltar. O Irã está dizendo aos britânicos que não houve qualquer confrontação bélica e não se registraram perdas humanas até aqui, ainda que o Oriente Médio esteja em situação ‘como de guerra’, com a guerra econômica que os EUA fazem contra o Irã.

Até aqui não há registro de vítima, apesar dos eventos importantes, massivos, que envolveram várias operações de sabotagem, a derrubada de um dos mais caros e sofisticadas drones dos EUA, a captura de dois navios-tanques e um sinal de aviso dado a um avião-espião dos EUA, que escapou por um milímetro dos mísseis iranianos.

O líder iraniano Said Ali Khamenei ordenou que o Corpo de Guardas da Revolução Islâmica continue a desenvolver seu programa de mísseis e injetou no programa bilhões de dólares. O líder criticou ambos, o presidente Hassan Rouhani e o ministro de Relações Exteriores por terem levado o país a assinar acordo com EUA e União Europeia quando essas duas entidades são parceiras entre elas e absolutamente não merecem confiança.

Assim sendo, a única saída parece estar no rumo que o Irã está seguindo, especialmente em momento em que a Europa continua dividida. O Reino Unido ruma para eleger Boris Johnson [já foi eleito líder do Partido Conservador e já é primeiro-ministro (Guardian, 23/7)], candidato favorito do presidente dos EUA. O Reino Unido está em situação crítica, e o “no-deal British exit” (saída dos britânicos, da Comunidade Europeia, sem acordo algum) enfraquecerá o país e o isolará. – E Trump, com certeza, não dará um passo para resgatá-lo.

No momento, o Irã está deixando ver sua política: olho por olho. O país está preparado para guerra, tanto quanto os EUA; está pois preparado para o “absolute worst” [para o “pior absoluto”], como disse Trump.

Os EUA estão aumentando a própria capacidade militar, com a reabertura da base aérea norte-americana na Arábia Saudita (base de deserto Príncipe Sultan – a mesma base que os EUA usaram para a guerra que fizeram contra Saddam Hussein em 1990.

O Irã trabalha ativamente com seus aliados, grupos Palestinos, o Hezbollah libanês, vários grupos iraquianos e aliados iemenitas, fornecendo a esses todos mísseis suficientes para sustentar guerra longa no caso de ser necessário – mas ainda, obviamente, sem provocar.

O Irã continuará sua guerra nas sombras, e continuará a atormentar os países ocidentais, sem considerar os estados árabes, de modo que sua guerra não tome alguma direção sectária. Povos do Oriente Médio assistem as perigosas escaramuças e sentem que o dedo do Irã está no gatilho. O Irão não hesitará em atirar quando entender que seja adequado, e não importa quem seja o oponente ou oponentes.

Muito provavelmente, os EUA terão de esperar e pensar cuidadosamente sobre o próximo movimento, particularmente sobre construir uma coalizão de segurança marítima para patrulhar o Golfo e proteger navios durante as seis horas necessárias para transitar pelo Estreito de Ormuz. Quanto maior a presença militar ocidental nas vizinhanças do Irã, mais rico o banco de alvos e objetivos que se oferecem ao Corpo de Guardas da Revolução Islâmica, e mais fácil, para Teerã selecionar o alvo que mais interesse – em caso de guerra – sem disparar mísseis de longo alcança contra bases dos EUA estabelecidas no Oriente Médio ou qualquer outro alvo de longa distância.

Washington não irá à guerra se o resultado não seja claro, pelo menos para os norte-americanos. E, com o Irã, nenhum resultado pode ser previsto com certeza. O Irã conhece bem as fraquezas dos EUA, e está jogando com elas. Está mostrando que o Ocidente, apesar dos músculos cenografados, é frágil e, mesmo, vulnerável.

Traduzido por Coletivo de tradutores Vila Mandinga

Elijah J. Magnier é correspondente Veterano de Zona de Guerra e Analista de Risco Político Sénior com mais de 35 anos de experiência cobrindo o Oriente Médio tendo adquirindo experiência profunda e conhecimento político no Irão, Iraque, Líbano, Líbia, Sudão e Síria. Especializado em terrorismo e contra-terrorismo, inteligência, avaliações políticas, planeamento estratégico e aprofundamento nas redes políticas da região.

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