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O Ocidente é um deserto distópico de degenerescência moral

por Caitlin Johnstone (PT) | Caitlin’s Newsletter

A Estátua de Sal - 13 de setembro, 2024

https://estatuadesal.com/2024/09/13/o-ocidente-e-um-deserto-distopico-de-degenerescencia-moral/

Geralmente, quando se ouve uma pessoa branca a falar sobre degenerescência moral, trata-se de algum maluco denunciando os direitos LGBTQ, ou os direitos reprodutivos das mulheres, ou o que quer que seja, mas não é isso a que eu me quero referir. Neste caso, estou a falar de coisas reais.

A verdadeira decadência moral da nossa sociedade é ilustrada pela forma como todos os candidatos políticos tradicionais podem apoiar abertamente, na atualidade, crimes de guerra infligidos a pessoas do Sul Global, sem serem imediatamente removidos do poder. Pela forma como monstruosos criminosos de guerra de administrações anteriores (Dick Cheney) podem apoiar um candidato liberal sem que os autoproclamados progressistas se afastem desse candidato com horror. Pela forma como os dois candidatos viáveis e elegíveis para o cargo mais poderoso do mundo, podem prometer continuar um genocídio ativo sem desencadear instantaneamente uma revolução.

A degenerescência moral da nossa civilização manifesta-se também quando vivemos vidas de relativo conforto, construídas à custa dos trabalhadores do Sul Global, cuja mão-de-obra e recursos são extraídos das suas nações por métodos profundamente exploradores, enquanto chovem explosivos militares sobre as populações empobrecidas que se atrevem a desobedecer aos ditames do nosso governo, dia após dia, ano após ano, década após década, e agimos como se tudo isso fosse bom e normal.

Nascer na civilização ocidental é como acordar no meio de uma multidão de linchamento. Algo terrível está a acontecer, mas toda a gente alinha e diz que está tudo bem e que é normal, e mesmo que consigas perceber que o que eles estão a fazer é errado, no meio de todo o caos e confusão, dás por ti impotente para os impedir, porque a coisa toda já tem muito ímpeto e, há demasiadas pessoas cegamente apanhadas no frenesim da sede de sangue, para que consigas fazer com que eles mudem de rumo. Continuar a viver no meio deles torna-te cúmplice das suas acções em muitos aspetos, mas não tens para onde ir, para além da cidade de linchamento em que nasceste. Por isso, mudas-te para as franjas da multidão e partilhas as tuas objeções com as poucas pessoas que te ouvem.

A nossa civilização é cruel e selvagem, mas nós afastamo-nos da sua crueldade e selvajaria, rindo-nos das nossas comédias e dos nossos comediantes insípidos e fazendo de conta que as piores coisas que acontecem politicamente na nossa sociedade são as questões da guerra cultural (LGBT e afins) que os especialistas e os políticos preferem que continuemos a discutir.

Vivemos as nossas vidas sedados pelo entretenimento, pelas redes sociais, pela comida e pelos produtos farmacêuticos, enquanto o genocídio, a guerra nuclear e o ecocídio se desenrolam à nossa volta, achando que somos bons e virtuosos se formos carinhosos com os nossos animais de estimação e se tivermos as opiniões corretas sobre a justiça racial e as vacinas.

Se nós, enquanto sociedade, fôssemos realmente bons, nada disto estaria a acontecer. A lucidez moral consideraria tudo isto intolerável e rejeitá-lo-ia e anulá-lo-ia por todos os meios necessários. É por isso que os poderosos gastam tanta energia a manter-nos sedados e confusos. Muito poder e riqueza dependem da nossa falta de clareza moral.

Há muita riqueza que está a ganhar com a exploração do trabalho e com a extração de recursos em todo o mundo. Há muito poder que está a ser assegurado assassinando, matando à fome e aterrorizando as populações que se recusem a curvar-se aos interesses do Império ocidental. É por isso que o Império ocidental tem a máquina de propaganda mais sofisticada alguma vez concebida: porque tanta riqueza e poder dependem da garantia de que o Ocidente se mantém num estado de degenerescência moral e de que os ocidentais não consideram os cidadãos do Sul Global como plenamente humanos.

Pessoalmente, rejeito a religião, não porque seja uma idiota que usa chapéu de feltro e goza com as pessoas por acreditarem em Deus, mas porque rejeito todos os aspetos da cultura, profundamente doentia em que nasci. Como não me identifico com a religião, sinto-me muitas vezes afastada do jargão religioso que qualifica as acções do Império ocidental como “demoníacas” – ou chama aos EUA “o grande Satã” – mas, ao mesmo tempo, compreendo-o perfeitamente.

Quando vejo em imagens de vídeo, pela centésima vez, o interior do crânio de uma criança, ao lado de soldados das IDF vestidos com as roupas de mulheres palestinas mortas ou deslocadas e brincando com os brinquedos das crianças mortas ou deslocadas – enquanto os pontífices ocidentais fingem acreditar que o exército que estão a armar não fez nada de errado –, tenho dificuldade em encontrar adjetivos suficientemente fortes para descrever o que estou a ver. Talvez “demoníaco” seja o mais adequado, mesmo que eu não acredite em demónios bíblicos reais.

É disso que estou a falar quando digo que o Ocidente é um deserto de degenerescência moral. O tipo de civilização que permite que o seu governo faça coisas destas tem, necessariamente, uma consciência coletiva que foi tão deformada e distorcida pela propaganda e pelo interesse próprio que é o mesmo que não ter consciência nenhuma.

Se não se pode considerar a grande maioria da população deste planeta como totalmente humana e igual a nós próprios, então, moralmente falando, não somos melhores do que os praticantes da escravatura e do genocídio, que nos ensinaram a julgar negativamente nas aulas de História.

E essa é a norma aqui, no Ocidente. É aquilo em que nascemos. É o que passamos toda a nossa vida a ser treinados para aceitar como normal.

Trad. Estátua de Sal

Caitlin Johnstone é uma jornalista independente e rebelde de Melbourne (Austrália), apoiada pelos seus leitores. É a autora do livro de poesia ilustrado “Woke: A Field Guide For Utopia Preppers.” O seu trabalho é inteiramente apoiado por leitores e o seu sítio é aqui.

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