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Republicando - Privatização: o coração do fascismo

Privatizações estão cada vez mais em moda, na Grécia, na Ucrânia, nos EUA e na Grã-Bretanha – e privatizações são um dos traços centrais do fascismo.

Por Eric Zuesse | Strategic Culture Foundation

Blog do Alok - 13 de fevereiro, 2019

http://blogdoalok.blogspot.com/2019/02/republicando-privatizacao-o-coracao-do.html

O núcleo do fascismo é a ideia de que há alguma elite – seja "os arianos" seja "o povo escolhido por Deus" ou assemelhados – que devem comandar; e todos os demais seres humanos existem para servir àquela elite. Inevitavelmente, essa elite oficial consiste no pessoal que o poder, seja qual for, escolhe para serem os proprietários de tudo que tenha valor de venda. E crescentemente os bens vão-se tornando propriedade privada daquela gente – e até o que foi criado como patrimônio público torna-se privado. Praias tornam-se privadas. Escolas. Florestas. Rios. Recursos naturais em geral tornam-se privados. Não se trata só da arte que os nazistas roubaram e privatizaram e/ou exibem em museus controlados por eles, que se torna privada; é tudo que aquela elite deseje ter e controlar: tudo será privatizado. Esse é o ideal fascista.

O sistema legal/judiciário fascista acomoda os proprietários legais fascistas em qualquer nação fascista, assim como qualquer sistema legal/judiciário acomoda os proprietários legais em absolutamente qualquer nação. E, no fascismo, os proprietários legais são a aristocracia, que é constituída do pessoal que ajudou a fazer do sistema o que ele hoje é. Nos casos-padrão, é a aristocracia que já existe numa dada nação, se antes foi uma democracia (aristocratas tendem a odiar a democracia; por isso criam o fascismo para substituí-la), mas também pode ser um grupo parcialmente novo e parcialmente composto do segmento vitorioso da velha aristocracia – o segmento da velha aristocracia que venceu o conflito intra-aristocracia que sempre há, dentro de qualquer aristocracia. Ao mesmo tempo em que qualquer aristocracia sempre está em guerra contra o bem público, assim também há concorrência dentro de todas as aristocracias, para determinar quais aristocratas dominarão os demais.

Todos os fascismos são controlados pela aristocracia nacional e servem a essa gente – não ao público, que nada recebe, além de propaganda do regime dos aristocratas. Mesmo numa ditadura, não só numa democracia, a mídia-empresa é indispensável para vender ao público as políticas do governo. Se a imprensa-empresa, vira imprensa-empresa-privada... ela se torna propriedade daquela aristocracia. A maioria do público não tem como escapar da propaganda. E se os aristocratas estão no comando, pouca gente algum dia chegará, sequer, a saber disso.

Assim, a privatização substitui patrimônio público, patrimônio do estado, por patrimônio privado, e assim transfere o controle, que deve caber a governos eleitos (que prestam contas, no mínimo, a cada quatro anos, diante da urna eleitoral), a acionistas privados, que não prestam contas a ninguém e que decidem sobre aquele patrimônio, seja uma escola, um hospital, terra, água, estradas, o que for. Tudo, qualquer coisa pode ser privatizada. Qualquer coisa pode ser comandada por alguma elite, por algum 'proprietário'. O fascismo se dedica a maximizar esse processo: tudo que algum dia foi propriedade pública é transformado em propriedade privada.

Sabendo-se disso, é fácil compreender por que

– o primeiro bloco de privatizações aconteceu na primeira nação fascista que o mundo conheceu, a Itália, nos anos 1920s;[1] e

o segundo bloco de privatizações ocorreu na segunda nação fascista, a Alemanha, nos anos 1930s.


Mussolini e Hitler

As privatizações começaram com Mussolini, depois foram instituídas com Hitler. A bola fascista continuou a rolar; e, depois de um hiato de umas poucas décadas, logo depois da fantasiada derrota dos fascistas na 2ª Guerra Mundial, as privatizações reapareceram; e novamente vieram à tona depois de 1970, quando forças fascistas na aristocracia global – através de CIA, FMI, Grupo de Bilderberg e Comissão Trilateral – impuseram o reino global dos maiores proprietários privados de ações e papéis: outra vez os aristocratas do mundo ganham porcentagens crescentes do que, antes deles, foi patrimônio público.

As privatizações, depois de terem nascido em berço fascista durante os anos que antecederam a 2ª GM, voltaram a aparecer:

– nos anos 1970s, no governo fascista do ditador chileno Augusto Pinochet;

– nos anos 1980s, no governo fascista da britânica Margaret Thatcher (apaixonada apoiadora do apartheid na África do Sul); e também

– no governo de Ronald Reagan, fascista sorridente (que veio depois do sucesso da "Estratégia Sul" de Richard Nixon, de dominação branca no então ressurgente conservadorismo norte-americano, e que se pode dizer que foi o primeiro presidente absolutamente fascista que os EUA tiveram); e

– nos anos 1990s sob vários governos fascistas – de líderes que antes haviam sido comunistas, em toda a já então autodissolvida União Soviética, os quais, sob a orientação dedicada do departamento fascista de Economia da Universidade de Harvard–transferiram o controle, da nomenklatura de antes, para os "oligarcas" dependentes do ocidente de hoje.

E as privatizações estão novamente em fúria, ativas por todo o mundo, como nos EUA fascistas e no Reino Unido fascista. [e das privatizações na Grécia fascistizada pela Alemanha plus Eurogrupo, então, nem se fala (NTs)]

Mussolini era o homem do futuro, mas – depois que morreram Franklin Delano Roosevelt, Thatcher (finalmente) e Reagan, e outros 'livres-mercadistas' assumiram o poder –, a cada dia que passa, mais o "futuro" de Mussolini vai-se tornando nosso "agora": a ideologia das Potências do Eixo realmente está vencendo no mundo pós-2ª GM. Só que, dessa vez, é chamada por nomes como "libertarismo" [ing. libertarianism] ou "neoliberalismo", não mais como "fascismo".

É a Grande Safadeza. A Grande Mentira. O simples movimento de rebatizar o fascismo, que passa a chamar-se "libertarismo" ou "neoliberalismo", bastou para enganar as massas. Convenceu-as de que haveria fascismo pró-democracia...

O "capitalismo" também foi redefinido, para se referir exclusivamente à forma de capitalismo controlado pela aristocracia: o fascismo. A batalha ideológica foi assim aparentemente ganha, com um truque barato de manipulação terminológica. Basta isso, para a ditadura safar-se e vencer.

A forma de capitalismo socialmente controlado, como se viu em alguns países do norte da Europa, tem sido chamada em geral de "socialismo"; e, claro, opõe-se a todas as formas de ditadura, sejam comunistas sejam fascistas. O socialismo é a forma democrática do capitalismo, é a forma de capitalismo que serve ao interesse público, em vez de servir à aristocracia, em todos os pontos em que os interesses sejam conflitantes. O socialismo subordina a aristocracia ao público.

O fascismo, ao contrário, subordina o público à aristocracia, e é a tendência mais forte (porque "Os 0,7% mais ricos do mundo são proprietários de 13,67 vezes mais que os 68,7% mais pobres" e "As 80 Pessoas mais Ricas do Mundo Possuem a Mesma Quantidade de Riqueza que os 50% mais Pobres do Mundo).

(Assim, reconhecendo essas duas realidades chocantes aí conectadas, as decisões básicas do mundo podem realmente ser tomadas por não mais de uma centena de pessoas, cujos representantes, em fóruns como Bilderberg, podem coordenar privadamente todas as coisas e, assim, manter uma espécie de supra-governo global, do qual aqueles representantes são ministros. A missão deles é fazer acontecer, nos detalhes, o que quer que tenha sido decidido entre os agentes em benefício próprio.

Os pagamentos podem ser feitos pela via normal, entre as respectivas corporações, e esse arranjo pode incluir pagar empresas de lobbyistas, etc. – e também empresas de mídia, anúncios, sejam de 'produtos' comerciais ou de 'produtos' políticos, para manter tudo alinhado com o plano global-aristocrático geral.)

Em décadas recentes, a aristocracia internacional, com os EUA à frente, puseram, de fato, em movimento, um plano para privatizar um emergente governo mundial, e assim impedir que venha a ser democrático: em vez de socialista, querem que seja governo mundial fascista.

Suas origens podem ser encontradas nos próprios escritos de Mussolini.[2]

(Se se pudesse dizer que ele tinha um "Plano B", bem poderia ter sido esse, e a total adoção do plano parece ser só uma questão de tempo. O atual sistema fascista informal – via reuniões de Bilderberg etc., – como acabo de historiar, seria então operado pelas franjas daquele sistema mais formal, que destruiria a soberania nacional e qualquer traço de democracia, em muitos assuntos atuais de governo, como regulação ambiental e segurança do consumidor.

Em certo sentido, virtualmente todo o mundo seria uma prisão onde se prenderia o que é público, e só aristocratas teriam a chave que abriria a porta –, se e quando tivessem vontade de deixar que algum item público entrasse em seu minúsculo luxuriante mundo livre.)

Mussolini, vale registrar, não inventou o fascismo: ele o aprendeu de seu professor Vilfredo Pareto, um dos fundadores da teoria microeconômica prestigiada até hoje e intrínseca em todas as análises de custo/benefício nas economias capitalistas. (De fato, é economia fascista, nem socialista nem comunista. Ainda não há teoria microeconômica para democracias – não há microeconomia socialista, ou nenhuma que tenha havido sobreviveu). Teorias aristocráticas, como a de Pareto, foram então incorporadas ao que se chama "economia do bem-estar", criada para conviver com sua teoria política, o fascismo. Pareto foi corretamente chamado de "o Karl Marx do fascismo".

Por exemplo: segundo Pareto, alforriar um(a) escravo(a) seria errado, a menos que o proprietário aceitasse a que a alforria do escravo fosse incluída noutra transação, e o proprietário ficasse satisfeito com o pagamento a receber em toda a transação. Se o proprietário do escravo não ficasse satisfeito, a transação seria "ineficiente", na terminologia da teoria microeconômica fascista – que está na base da economia capitalista que há hoje – a economia que é ensinada em todo o mundo.

O presidente Abraham Lincoln dos EUA foi uma das primeiras pessoas a pregar coerentemente a favor do socialismo. Se para Pareto a propriedade vem em primeiro lugar, para Lincoln em primeiro lugar vêm as pessoas. Para Pareto os direitos de propriedade eram supremos. Para Lincoln, em primeiro lugar vinham os direitos humanos.

Lincoln foi tragicamente assassinado por um conservador, e o partido político que ele ajudara a fundar (o Partido Republicano) foi rapidamente tomado por aristocratas norte-americanos – o que também está narrado no link acima, deixando claro que Lincoln teria desprezado o Partido Republicano que houve depois dele; o teria repudiado).

Embora os EUA hoje se oponham ao socialismo, os dois maiores presidentes dos EUA, Lincoln e Franklin Delano Roosevelt, foram ambos socialista: os dois punham os direitos humanos acima dos direitos de propriedade; os dois prestigiaram o capitalismo democrático. Diferente de FDR, Lincoln viveu antes de o fascismo existir; naquele momento o equivalente era o feudalismo, e Lincoln estava decidido a pôr fim ao feudalismo no sul dos EUA – daí a Guerra Civil.

Vários intelectuais norte-americanos já escreveram que ambos, Lincoln e FDR eram "socialistas", e no caso de Lincoln, Claude Fischer, por exemplo, lista as ações desse presidente como motivo de o classificar como "socialista". Lincoln não foi mero socialista pioneiro; de fato, foi socialista bem amadurecido.

Os EUA só se tornaram estado fascista em décadas recentes. No fim de uma análise de dados de pesquisa em 2012, eu mesmo escrevi: "O perigo de o mais consumado fascismo chegar rapidamente a Washington é bem real – a culminação da deriva de Reagan rumo à direita. É o que se vê não só em dados de pesquisa, mas também todos os dias no noticiário, especialmente se observamos as notícias à luz da história. Todos devem saber que esse risco existe." Mas hoje, diria de outro modo: Já aconteceu.

O último presidente dos EUA antes de Ronald Reagan, Jimmy Carter, disse recentemente, num surpreendente arroubo de honestidade, refletindo sobre o que acontecera aos EUA depois que deixou a presidência:

"Hoje já não passa de uma oligarquia, e a corrupção política sem limites é a essência da indicação à candidatura ou da eleição à presidência. E a mesma coisa se aplica a governadores e aos senadores e membros do Congresso dos EUA. Significa que hoje assistimos à subversão de nosso sistema político, que existe hoje para recompensar os principais doadores das campanhas, que querem e esperam, e muitas vezes obtêm, depois que passam as eleições, privilégios para eles mesmos."

Aí está descrito precisamente o fascismo: o próprio governo foi privatizado. *******

[1] BEL, Germà, From Public to Private: Privatization in 1920's Fascist Italy [Do Público ao Privado: Privatização nos anos 1920s, na Itália Fascista], 2009, Series/Report (Instituto Universidade Europeia), n. EUI RSCAS; 2009/46 / URI: http://hdl.handle.net/1814/12319 / ISSN: 1028-3625 (livre acesso)

RESUMO [aqui traduzido]:

O governo fascista da Itália aplicou política de privatizações em grande escala entre 1922 e 1925. O governo fascista privatizou o monopólio estatal de match sale, eliminou o monopólio estatal sobre seguros de vida, vendeu quase todas as redes telefônicas estatais para empresas privadas, reprivatizou a maior produtora de máquinas e deu concessões a empresas privadas para construir e operar estradas. Embora considerações ideológicas também tenham pesado, as privatizações foram usadas como ferramenta política para ganhar o apoio dos empresários e industriais para o governo e o Partito Nazionale Fascista. As privatizações também contribuíram para equilibrar o orçamento – principal objetivo da primeira fase da política econômica fascista."

[2] "A corporação joga no terreno econômico exatamente como o Grande Conselho e a milícia jogam no campo político. O corporacionismo é economia disciplinada e daí vem o controle, porque ninguém pode imaginar disciplina sem diretor. O corporacionismo está acima do socialismo e acima do liberalismo. Criou-se uma nova síntese."

Traduzido pelo Coletivo Vila Mandinga

Eric Zuesse é historiador investigativo e autor de They’re Not Even Close: The Democratic vs. Republican Economic Records, 1910-2010 e CHRIST’S VENTRILOQUISTS: The Event that Created Christianity.

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