Plutocracia.com

Bookmark and Share

Agitação social como obstáculo à intervenção militar colombiana na Venezuela

por W. T. Whitney | Counterpunch

Pelo Socialismo - 13 de maio, 2019

https://pelosocialismo.blogs.sapo.pt/agitacao-social-como-obstaculo-a-66322

Os governos de direita colombianos, obedientes aos Estados Unidos e insatisfeitos com a Venezuela socialista, deram apoio à pressão dos Estados Unidos para uma mudança de regime naquele país. Quais são as capacidades da Colômbia para intervir militarmente na Venezuela? A corrente dominante e os média alternativos pouco dizem a este respeito. O argumento, aqui, é que a instabilidade política na Colômbia está permanentemente no caminho das forças militares daquele país, intervindo mais do que é atualmente o caso.

15.000 paramilitares colombianos estão a operar em 10 estados do oeste da Venezuela. A maioria deles trabalham para ou cooperam com proprietários e empresários. Controlam rotas de viagens, economias locais, fornecimento de alimentos e, até mesmo, serviços de saúde e escolas. Cruzando uma fronteira porosa em ambas as direções, envolvem-se no narcotráfico, no contrabando de bens e pessoas, na segurança privada, no tráfico de armas, em sequestros, casinos, troca de moeda, roubo de terras, mineração ilegal, terrorismo e combate militar. Chegaram à Venezuela em 1997.

No início da década de 1960, os assessores militares dos EUA recomendaram que o governo da Colômbia usasse paramilitares para combater as insurgências de esquerda. De acordo com um analista, eles são “recrutados e treinados pelos militares e a inteligência colombianos … Os militares e os grupos paramilitares trabalharam em coordenação para expulsar populações inteiras”. O Centro Nacional de Memória Histórica da Colômbia culpa os paramilitares de causarem 94.754 mortes na Colômbia, principalmente de civis, ao longo de 50 anos.

O líder paramilitar colombiano Carlos Castaño, alegadamente, “reuniu-se com 140 empresários e latifundiários venezuelanos [em 1997] para criar uma estrutura paramilitar semelhante à que liderou na Colômbia”. Um repórter citou Castaño como tendo dito: “Temos pessoas a dar instruções em território venezuelano. Mantemos comunicações”.

Em 2003, um relatório lembrou que em ataques paramilitares, ao longo de quatro anos, “120 camponeses e líderes indígenas foram assassinados”. As autoridades venezuelanas acusaram 116 paramilitares, que prenderam em 2004, de se prepararem para assassinar o presidente Hugo Chávez.

Os paramilitares colombianos foram responsáveis por uma onda de assassinatos políticos, no início de 2010, e, em 2015, mais 200 venezuelanos foram assassinados. As autoridades prenderam alguns daqueles grupos, em 2013 e 2017. Em Caracas, presentemente, realizam assassinatos seletivos de ativistas políticos de esquerda.

O jornalista colombiano Fredy Muñoz afirma que a oposição de direita “os usa para realizar as ações mais cruéis, como assassinatos seletivos, incêndio de jovens, ou destruição de infraestruturas do Estado”. Os paramilitares colombianos são conhecidos por coordenarem as violentas manifestações de rua da oposição (as “guarimbas”). Eles treinaram alguns dos participantes na tentativa de assassinato do presidente venezuelano Nicolás Maduro, em 4 de agosto de 2018.

Em contraste com as forças militares regulares, os paramilitares são autossuficientes, discretos e baratos. Oferecem vantagens na desestabilização, que é a sua principal missão. Infiltram-se em vez de invadir, facilitando assim o encobrimento da violação das normas internacionais. E a transferência de grandes unidades militares para a Venezuela apresentaria grandes desafios logísticos e administrativos. De facto, o exército da Colômbia é muito grande.

O pessoal militar regular atinge o número de 511.550. Os gastos militares, em 2018, consumiram US $9,7 mil milhões. Em percentagem do PIB, os gastos militares da Colômbia, em 2017, foram de longe os maiores da América Latina. O governo dos EUA há muito tempo que fornece assistência militar. Desde 2000, fornece equipamentos, treino e mais de US $10 mil milhões em financiamento, além de ter aí bases com tropas, militares contratados e aviões militares.

Mas há outro problema no caminho da intervenção militar colombiana na Venezuela: as tropas deslocadas para a Venezuela deixariam de exercer as suas funções na Colômbia.

O Exército colombiano realiza há muito tempo operações dentro das fronteiras colombianas, sendo o massacre dos bananeiros, em Magdalena, em 1928, um excelente exemplo. Recentemente, teóricos militares de todo o mundo têm trabalhado para justificar as atividades militares domésticas. Por exemplo, “Prism”, o jornal da Universidade Nacional de Defesa, apela às forças armadas para que, em qualquer lugar, estejam aptas a “ resolver crises nacionais [como] distúrbios civis” e a lidar com desafios à “segurança e estabilidade domésticas e regionais”. E Juan C. Correa, um oficial do Exército colombiano que estudava na Escola de Estudos Militares Avançados do Kansas, analisou o tema “operações de estabilidade”. De acordo com a sua tese, elas são o meio pelo qual a Colômbia pode “conseguir uma dissuasão a longo termo contra ameaças terroristas e criminosas”.

O Exército da Colômbia pode, de facto, estar a priorizar a frente doméstica. Surgiram aí, recentemente, novos elementos de instabilidade e os líderes civis e militares, presumivelmente, não deixam de os ver. São: o aumento das divisões, antagonismos e sofrimentos com base de classe e, em segundo lugar, uma onda contínua de protestos. Aqui estão os factos:

Entre janeiro de 2016 e 27 de março de 2019, foram assassinadas 498 pessoas, que incluem 113 líderes comunitários, 18 líderes de movimentos políticos, 9 líderes laborais, 7 ativistas ambientais, 6 reclamantes de terras, 5 defensores dos direitos humanos, 31 líderes indígenas, 28 líderes camponeses e 24 líderes afro-colombianos. Desde a assinatura do acordo de paz entre os insurgentes das FARC e o governo, no final de 2016, os assassinatos atingiram mais de 129 ex-guerrilheiros das FARC e 431 líderes sociais e comunitários (alguns dos quais foram contabilizados acima).

Durante os últimos 10 anos, 5.000 crianças índias Wayúu morreram de fome no estado de La Guajira; 58 por cento das pessoas vivem ali na pobreza – 25 por cento delas em extrema pobreza. A taxa de pobreza dos moradores de Buenaventura, na costa do Pacífico, é de 80% - 41% vivem em extrema pobreza; 71% têm acesso limitado à água; 40 por cento não têm esgotos; e 65 por cento não têm emprego. Metade dos colombianos vivem com menos de US $6 por dia; 4 por cento, com menos de US $2 por dia. Em 2015, a Colômbia classificou-se no 11.º lugar mundial na desigualdade de rendimentos.

No início de março, indígenas do sudoeste da Colômbia convocaram uma Minga (a palavra quéchua significa “esforço coletivo para o bem comum”). Mais de 15.000 pessoas reuniram-se em Cauca e bloquearam a estrada Panamericana, entre Popayán e Cali, durante 25 dias. Em meados de abril, o presidente Ivan Duque recusou encontrar-se com eles. A polícia de choque e elementos do Exército foram para o local e fizeram mortos e feridos.

Os manifestantes exigiam o direito à terra, não mais discriminação e autonomia na organização dos cuidados de saúde e na educação. Denunciaram a não implementação do acordo de paz entre o governo e as FARC e, como relatou Virginie Laurent, apelaram à “luta partilhada” a favor de uma “mudança radical na Colômbia, para combater a marginalização e a exploração da maioria da população”. A Minga estendeu a mão a aliados não indígenas.

A Greve Cívica Nacional de 25 de abril, concretizada por ativistas de dezenas de organizações, incluindo a Minga, realizou marchas, assembleias , protestos e manifestações em estradas em todo o país. A “outra Colômbia, ou Colômbia profunda” levantou-se em “defesa da vida e defesa da autonomia – isto é, da soberania nacional”, relatou Nelson Lombana Silva, escrevendo para o sítio na rede do Partido Comunista. Estavam a protestar contra as mortes; contra os assaltos a sindicatos, por direitos agrários e educação pública; contra a não implementação dos acordos de paz; contra a rédea livre para os paramilitares; contra bases militares dos EUA na Colômbia; e contra o “uso do território nacional para atacar política e militarmente a Venezuela”, por parte dos EUA.

Em algum momento, e talvez seja agora, pode advir um surto revolucionário em todo o país. Seria a primeira vez, desde 1948.

Naquele ano, o líder do Partido Liberal, Jorge Eliécer Gaitán, um socialista, estava em vias de se tornar presidente da Colômbia, em 1950. Liderara as massas agrárias colombianas contra a violência que um governo ultraconservador usara para defender as holdings de latifúndios. Um assassino matou Gaitán, em 9 de abril de 1948. O governo culpou os comunistas e abriu as portas a uma violência extrema, que duraria décadas. A repressão tornou-se a norma.

No final de 50 anos de guerra contra os insurgentes das FARC, as esperanças de paz e de resolução dos graves problemas sociais eram altas. Mas o acordo de paz está em pedaços, a violência continua e os processos políticos estão emperrados. Altos funcionários, provavelmente, presumem que os revolucionários estão a repensar opções. Procurando prevenir novos focos de instabilidade, o governo, logicamente, desejaria que as tropas regulares permanecessem na Colômbia, onde são necessárias, em vez de serem deslocadas para a Venezuela.

Tradução do inglês de MFO

W. T. Whitney Jr. é um pediatra aposentado e jornalista político, que mora no Maine.

https://pelosocialismo.blogs.sapo.pt/agitacao-social-como-obstaculo-a-66322


Concorda? Discorda? Comente e partilhe as suas ideias
Regras da Comunidade


Lista de artigos

e-mail: info@plutocracia.com
http://plutocracia.com/

| Termo de Responsabilidade |