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Dar a bomba nuclear à Arábia Saudita
por Chris Hedges | TruthDig
Resistir.info - 7 de março, 2019
https://www.resistir.info/moriente/a_saudita_nuclear_05mar19.html
A decisão de política externa mais perigosa da
administração Trump e sei que isso diz muito
é a de compartilhar tecnologia nuclear sensível com a
Arábia Saudita e autorizar empresas norte-americanas a
construírem reactores nucleares naquele país. Passei sete anos no
Médio Oriente. Cobri aquele reino despótico e repressivo como
chefe do escritório de
The New York Times
no Médio Oriente. E, juntamente com a maioria dos demais arabistas nos
Estados Unidos, tenho poucas dúvidas de que dar uma capacidade nuclear
à Arábia Saudita sob a liderança do implacável e
amoral príncipe Mohammed bin Salman faria com que embarcasse num
programa de armas nucleares e acabasse popr partilhar esta tecnologia com
aliados sauditas e
proxies
que incluem uma série de jihadistas radicais e inimigos mortais da
América. Uma Arábia Saudita nuclearizada é uma grave
ameaça existencial para o Médio Oriente e, em última
análise, para os Estados Unidos.
A iniciativa de construir reactores nucleares na Arábia Saudita é
liderada pelo genro estúpido do presidente, Jared Kushner,
que se reuniu terça-feira
com Salman em Riad, capital da Arábia Saudita, para discutir
"meios para melhorar a condição de toda a região
através de investimentos económicos", segundo a Casa Branca.
Claramente envolvidos nesse programa económico estão
corporações como a
IP3 International
, um consórcio de empresas dos EUA
liderado por vários generais
e almirantes reformados
e outros que se preparam para ganhar milhões com o acordo.
O governo saudita, que está a solicitar propostas para os reactores
nucleares, supostamente gastou mais de US$ 450 mil num período de um
mês para pressionar a administração Trump a aprovar a
compra de equipamentos e serviços junto a fontes norte-americanas. A
Westinghouse Electric Co. e outras empresas americanas estão a
preparar-se para construir as instalações, o que permitiria
à Arábia Saudita enriquecer e reprocessar urânio. O
esforço secreto de dar à Arábia Saudita uma capacidade
nuclear é não só colossalmente estúpido, como foi
feito sem a revisão do Congresso, como exigido por lei e em
violação da
Lei de Energia Atômica
.
Acredita-se que Salman, cujos traços psicopatas lembram Saddam Hussein,
ordenou o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi no consulado saudita em
Istambul em outubro de 2018. Ele prendeu dissidentes, brutalmente expulsou
rivais, apreendeu
mais de US$ 100 mil milhões
em dinheiro de extorsão sequestrou e
torturou membros da família real
e instilou um nível de medo e terror dentro do reino, sempre uma
sociedade repressiva, sem igual na sua história moderna.
Donald Trump e Kushner, ao defenderem descaradamente Salman, mesmo diante das
declarações da CIA de que a agência tem "alta
confiança" em que o príncipe ordenou o assassinato e
desmembramento do jornalista do
Washington Post,
ignoram este assassinato. Não é de surpreender que este
mês a Casa Branca tenha ignorado o prazo dado pela Comissão de
Relações Exteriores do Senado determinando para a
elaboração de um relatório sobre o assassinato de
Khashoggi. Kushner, a quem o líder saudita supostamente afirmou ter
"
no bolso
", não parece ter mencionado o assassinato de Khashoggi na
reunião da semana passada, o primeiro encontro cara a cara que teve com
Salman desde o assassinato.
Salman não descartou a possibilidade de voltar qualquer
instalação nuclear para a via armamentista. Em 2018 ele declarou:
"Sem dúvida, se o Irão desenvolver uma bomba nuclear,
seguiremos o mais rápido possível". Ele também se
recusou a aceitar quaisquer restrições ao enriquecimento de
urânio e ao processamento de plutónio.
As armas nucleares podem ser feitas de urânio ou de plutónio. O
isótopo urânio-235 é usado tanto em reactores como em
bombas nucleares. No entanto, menos de 1% deste elemento ocorre naturalmente e
deve ser aumentada a proporção o processo chama-se
enriquecimento para cerca de 5% a fim de funcionar em reactores
nucleares. Para fabricar bombas nucleares, ele deve ser enriquecida em cerca de
90%. O enriquecimento é realizado através de máquiinas
centrífugas de alta velocidade. Isso significa que as máquinas
que produzem combustível de reactor nuclear para uso civil também
podem ser utilizadas para produzir bombas nucleares. É por essa
razão que material nuclear em instalações de
enriquecimento civis em nações que não possuem armas
nucleares, ou que se comprometeram a não produzi-as, como o Irão,
é monitorado de perto pela Agência Internacional de Energia
Atômica (AIEA).
Uma fábrica de enriquecimento usada para abastecer um reactor nuclear
tem o potencial de produzir 20 bombas nucleares por ano usando cerca de 300
centrífugas para enriquecer o urânio-235 ao nível de 90%.
Uma bomba nuclear requer cerca de 55 libras [25 kg] de urânio altamente
enriquecido. Quanto mais centrífugas de alta velocidade um país
tiver, mais rapidamente poderá produzir o urânio de grau militar.
Salman e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, insistem que
existe um programa secreto de armas nucleares iranianas, apesar de todos os
relatórios de inteligência, incluindo relatórios da
inteligência israelense, indicarem o contrário. Assim,
considerando a sua versão única da realidade, a hora de
começar um programa de armas na Arábia Saudita é agora.
Israel tem um arsenal nuclear com centenas de armas.
O deputado Elijah E. Cummings, presidente do Comité de Supervisão
e Reforma da Câmara, emitiu um
relatório provisório
com testemunhos de vários denunciantes que advertem sobre a iminente
transferência de tecnologia nuclear. Apresenta em pormenor
cronológico os esforços secretos e flagrantemente ilegais da Casa
Branca de Trump para facilitar a compra e a construção dos
reactores nucleares pela Arábia Saudita.
Os esforços dos sauditas e americanos começaram antes da posse de
Trump. Autoridades sauditas, incluindo Khalid Al-Falih, o ministro da Energia,
se reuniram com Kushner em Nova York antes da posse. A delegação
saudita manteve a promessa de gastar US$ 50 mil milhões em contratos de
defesa americanos ao longo de quatro anos.
Os executivos do IP3 [International Professional Practice Partnership], general
Keith Alexander, general Jack Keane, Bud McFarlane e contra-almirante Michael
Hewitt, além dos executivos-chefes de seis outras empresas
Exelon, Toshiba America Energy Systems, Bechtel, Centrus Energy, GE Energy
Infrastructure e Siemens USA enviou uma carta a Salman três
semanas antes da posse do Trump, a qual apresentava um plano para construir
reactores nucleares na Arábia Saudita. Eles chamaram-no "Programa
da Ponte de Ferro", afirma o relatório, e caracterizaram-no como
"um Plano Marshall do Século XXI para o Médio Oriente".
Michael Flynn, então assessor de segurança nacional e um dos
ex-parceiros de negócios do empreendimento, enviou um texto a Alex
Copson do Parceiro Estratégico da ACU no Dia da posse assegurando-lhe
que o projecto nuclear estava "bom para avançar" e sugerindo
que Copson contactasse seus colegas a fim de "informá-los e por as
coisas em andamento", diz o relatório.
Em 27 de Janeiro de 2017, uma semana após a posse, Derek Harvey, que de
Janeiro a Julho de 2017 fora o director sénior para assuntos do
Médio Oriente e Norte da África no Conselho de Segurança
Nacional (NSC), reuniu-se na Casa Branca com um grupo de líderes do IP3
que ele havia convidado.
"Imediatamente após a reunião, o sr. Harvey orientou a
equipe do NSC a acrescentar informações acerca do "plano
para as 40 fábricas nucleares" do IP3 ao conjunto de assuntos para
o planeado telefonema do presidente Trump com o rei Salman [o pai do
príncipe e primeiro-ministro de Arábia Saudita]",
lê-se no relatório. "O sr. Harvey também declarou que
o general Flynn queria que o presidente Trump levantasse o "plano para 40
fábricas nucleares" com o rei Salman e que este era o "plano
de energia" que fora desenvolvido e aprovado pelo general Flynn durante a
transição presidencial.
Quando a equipe do NSC informou Harvey de que a transferência de
tecnologia nuclear para um país estrangeiro tinha de cumprir a Lei de
Energia Atómica, ele rejeitou a objecção, dizendo, nas
palavras do relatório, que "a decisão de transferir
tecnologia nuclear para a Arábia Saudita já havia sido feito
durante a transição presidencial e que o general Flynn pretendia
que o presidente Trump levantasse a questão das "fábricas
nucleares" junto ao rei Salman".
Em 28 de Janeiro de 2017, diz o relatório: "O General Flynn e o
vice-conselheiro de Segurança Nacional K.T. McFarland receberam dois
documentos nas suas contas oficiais de email da Casa Branca numa mensagem
intitulada 'Lançando o Plano Marshall para o Médio Oriente do sr.
McFarlane, co-fundador e director do IP3 e ex-assessor de segurança
nacional do presidente Reagan, o qual confessou-se culpado de participar no
encobrimento do Irão-Contra
em 1988".
Os documentos incluíam a capa de um rascunho do memorando de Flynn a
Trump e um rascunho do memorando "para o presidente assinar"
orientando chefes de agências a darem apoio a Thomas Barrack o
qual administrou o comité inaugural de Trump, levantou fundos para Trump
e cuja firma de investimentos, Colony NorthStar, lucraria com o acordo nuclear
para a implementação do plano IP3.
"O segundo documento foi formatado como um Memorando do Gabinete do
Presidente para os secretários de Estado, Defesa, Tesouro e Energia; o
director da Agência Central de Inteligência; e o presidente da
Joint Chiefs of Staff", diz o relatório. "Declarava que o
presidente Trump havia designado o sr. Barrack como representante especial para
supervisionar a implementação do Plano Marshall do Médio
Oriente: 'Designei um representante especial, Tom Barrack, para liderar esta
importante iniciativa e pedi-lhe que envolva cada um de vocês nos
próximos 30 dias a fim de obter vossa contribuição e apoio
ao nosso Plano Marshal [sic] do Médio Oriente".
Em 14 de março de 2017, Trump, junto com Kushner, encontrou-se com o
príncipe Mohammed bin Salman no Salão Oval. Eles discutiram
"um novo programa dos Estados Unidos e da Arábia Saudita ... em
energia, indústria, infraestrutura e tecnologia, com valor potencial
superior a US$ 200 mil milhões em investimentos directos e indirectos
nos próximos quatro anos".
Frances Townsend, directora do conselho do IP3, analista de segurança
nacional da [cadeia de TV] CBS e conselheira de segurança interna do
presidente George W. Bush, "contactou o conselheiro de Segurança
Interna da Casa Branca, Thomas Bossert, acerca do Plano Marshall do
Médio Oriente" em 28 de março de 2017, lê-se no
relatório.
"A sra. Townsend posteriormente enviou à equipe da NSC
vários documentos: (1) uma visão geral do Plano Marshall do
Médio Oriente que parecia ser produzida pelo IP3; (2) um documento
intitulado "The Trump Middle East Marshall Plan (White Paper by Tom
Barrack)" de 10 de Março de 2017; (3) a carta que os líderes
do IP3, o sr. McFarlane, o general Keane, o contra-almirante Hewitt e o general
Alexander dirigiram ao vice-príncipe herdeiro saudita Mohammed bin
Salman em 17 de Março de 2017; e (4) a carta de 1º de janeiro de
2017 ao vice-príncipe, Mohammed bin Salman, assinada pelos
líderes do IP3, general Alexander, General Keane, Bud McFarlane e
contra-almirante Hewitt, além dos executivos-chefes de seis empresas:
Exelon Corporation, Toshiba Energy, Bechtel Corporation, Centrus, GE Power e
Siemens EUA".
O livro branco de Barrack dizia: "O Presidente nomeará um
representante especial para o Plano Marshall Trump Médio Oriente com o
posto diplomático de embaixador ou assessor especial [para] o
Presidente". Também afirmou, diz o relatório, que o enviado
especial deveria "coordenar e trabalhar em estreita proximidade" com
funcionários do governo, incluindo Kushner.
"O livro branco declarava que o presidente deveria implementar o Plano
Marshall do Médio Oriente através de uma ordem executiva",
diz o relatório. "Ele descrevia o enviado especial como construindo
"relacionamentos de longo prazo com líderes do sector privado dos
EUA e actuando como seu acelerador na remoção dos tradicionais
obstáculos regionais e regulatórios para sua
participação" e "relacionamentos confiáveis com
os principais líderes dos países do Conselho de
Cooperação do Golfo (GCC) assim como Israel, Egipto,
Jordânia e Iraque".
O relatório do comité da Câmara diz que a maioria dos
denunciantes que conversaram com o comité foi capaz de documentar os
acontecimentos apenas durante os primeiros meses da
administração. Houve poucas fugas recentes dentro da Casa Branca
sobre o acordo nuclear. O secretário de Energia, Rick Perry, Kushner e
os executivos do IP3 estão actualmente a supervisionar o projecto.
"Em janeiro de 2018, a Brookfield Business Partners, subsidiária da
Brookfield Asset Management, anunciou seus planos para adquirir a Westinghouse
Electric por US$ 4,6 mil milhões", observa o relatório.
"A Westinghouse Electric é a empresa de serviços nucleares
em bancarrota que faz parte do consórcio proposto pela IP3 para
construir reactores nucleares na Arábia Saudita, e que deverá
beneficiar-se com o Plano Marshall do Médio Oriente. Em Agosto de 2018,
a Brookfield Asset Management comprou uma participação de
parceria na 666 Fifth Avenue, um edifício de propriedade da empresa
familiar de Jared Kushner".
"Em 27 de Fevereiro de 2018, o Goldman Sachs anunciou que a ex-assessora
de segurança nacional Dina Powell, que ajudou a administrar o
relacionamento de Jared Kushner com o príncipe saudita Mohammed bin
Salman e a planear a visita do presidente Trump em 2017 à Arábia
Saudita, unir-se-ia ao grupo de riqueza soberana do Goldman Sachs", diz o
relatório. "O Goldman Sachs escreveu num memorando interno que
"Dina concentrar-se-á em melhorar o relacionamento da empresa com
clientes soberanos em todo o mundo". A sra. Powell confirmadamente
"é especialmente próxima do Fundo de Investimento
Público da Arábia Saudita e da família governante do
país".
"Em março de 2018, o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman
realizou uma "visita de última hora a Nova York", onde alojou
sua comitiva no Trump International Hotel em Manhattan durante cinco dias, uma
estadia que supostamente foi suficiente para aumentar as receitas do hotel em
13 por cento "durante todo o trimestre", diz o relatório.
Em 12 de Fevereiro de 2019, Trump encontrou-se na Casa Branca com vários
desenvolvedores privados de energia nuclear. A reunião, afirma o
relatório, foi "iniciada pela IP3 International".
"O encontro incluiu discussões sobre os esforços dos EUA
para garantir acordos a fim de compartilhar a tecnologia nuclear dos EUA com
países do Médio Oriente, incluindo a Jordânia e a
Arábia Saudita", diz o relatório.
Há pouco tempo para impedir a transferência de tecnologia nuclear
para a Arábia Saudita. O Irão, inimigo mortal da Arábia
Saudita, não terá escolha a não ser iniciar um programa de
armas nucleares se os sauditas construírem reactores nucleares. A ideia
de armas nucleares estarem nas mãos de Salman, uma versão
actualizada de Saddam Hussein e, em última análise, nas
mãos de radicais jihadistas não-estatais, apoiados e financiados
por elementos poderosos da Arábia Saudita, é terrífica.
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Chris Hedges, repórter laureado com Prêmio Pulitzer, mantém coluna regular em Truthdig às 2as-feiras. Formou-se na Harvard Divinity School e foi durante quase duas décadas correspondente no exterior do The New York Times. Hedges é autor de 12 livros, entre os quais War Is A Force That Gives Us Meaning, What Every Person Should Know About War, e American Fascists: The Christian Right and the War on America o best-seller (New York Times), Days of Destruction, Days of Revolt (2012), do qual é coautor, com o cartunista Joe Sacco. Seu livro mais recente é Empire of Illusion: The End of Literacy and the Triumph of Spectacle.
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