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Acorde: você está sendo trolado

por Dmitry Orlov | Club Orlov

TLAXCALA - 3 de julho, 2019

http://www.tlaxcala-int.org/article.asp?reference=26434

Outra vez, o mundo está à beira da guerra. Outra vez, outra vez e, sim, mais outra vez. E de repente, não, já não estamos à beira da guerra... Mas... espere, vem outra por aí! Claro que aí vem mais, sempre vem. Grupos de combate com porta-aviões dos EUA navegam para a Coreia do Norte... ou talvez não. Estão apenas vagando para lá e para cá, sem rumo, longe da Coreia do Norte, mas com ares muito ameaçadores.

Aí, então, Trump e Kim Jong Un encontram-se, entendem-se às mil maravilhas, assinam um pedaço de papel que nada significa e separam-se como bons amigos. Os porta-aviões navegam por aí, muito menos ameaçadoramente. Então, Trump e Un encontram-se outra vez, assinam outro pedaço de papel completamente insignificante, mas então John Bolton põe a boca no mundo e o acordo gora completamente. Mas Trump e Un continuam a trocar cartas de amor, sinal de que amizades coloridas são duras de matar.

Seja como for, a guerra entre EUA e Coreia do Norte além de invencível por qualquer desses dois lados, também é impensável: a capital da Coreia do Sul está ao alcance da artilharia da Coreia do Norte e todas as bases militares dos EUA na região estão ao alcance dos foguetes da Coreia do Norte. Definitivamente não haverá guerra dos EUA contra a Coreia do Norte. Sumário executivo: acontece nada. Nesse caso, que conversa é essa, afinal de contas?

No momento, a conversa é sobre a Venezuela. O governante democraticamente eleito pelos venezuelanos foi declarado usurpador e já encontraram substituto recomendável, que atende pelo nome de Random Guy-doh[1]. Estados vassalos dos EUA em todo o mundo, foram forçados a garantir-lhe reconhecimento diplomático como presidente da Venezuela, ainda que não passe de joão-ninguém, num apartamento em Caracas. Alguns caminhões foram incendiados sobre uma ponte entre Colômbia e Venezuela. Carregavam ajuda humanitária, tipo rolos de arame farpado. Há conversa sobre intervenção militar, mas é só conversa. O Banco da Inglaterra confisca o ouro da Venezuela, os EUA congelam contas bancárias das empresas de petróleo nos EUA e as entregam a gangues de venezuelanos suspeitos para que as saqueiem. Até aí, tudo faz perfeito sentido; mas e o resto?! Tsk, tsk, tsk! Seja como for, nenhuma incursão militar dos EUA em território da Venezuela é sequer pensável, no reino das possibilidades: a Venezuela conta com sistemas russos de defesa antiaérea que converte o espaço aéreo venezuelano em zona de exclusão, impenetrável pela força aérea dos EUA; além do que, combater guerra de guerrilhas na selva venezuelana não é coisa que os militares dos EUA saibam fazer. Sumário Executivo: outra vez, acontece nada.

Atualmente, trata-se do Irã. Trump retirou-se do acordo internacional cuidadosamente negociado com o Irã e pôs-se a dizer que quer negociar outro acordo. Se você não viu, trata-se de movimento realmente imbecil, tipo “Nunca pagarei o que devo, então me empreste mais dinheiro”.

Se um país não honra os acordos que já assinou, por que perder tempo com negociar novos acordos com o tal país? (Não precisam responder: é pergunta retórica.) O Irã anuncia que, dado que os EUA não estão honrando o acordo, não há a acordo a honrar; assim sendo, o Irã tampouco honrará coisa alguma. Alguns navios-tanques foram danificados, e os EUA tentam culpar o Irã. Mas já ninguém acredita no que os EUA dizem. Então, mais alguns navios-tanques são danificados, e os EUA outra vez tentam culpar o Irã, mas outra vez ninguém acredita nos EUA.

Então, os EUA metem um drone no espaço aéreo iraniano, escondendo o drone por trás de um avião de reconhecimento, com tripulação internacional a bordo, apostando que o Irã cometeria um erro e derrubaria o avião de reconhecimento. Mas o Irã derruba o drone e o drone cai no raso, em águas territoriais do Irã, não a 30 metros de profundidade – que é o que os EUA tentam fazer-crer que teria acontecido, mas ninguém mais acredita nos EUA. O Irã rapidamente recupera e orgulhosamente exibe os pedaços do drone, que então já deixou de ser top secret drone. Os norte-americanos geram e passam a repetir uma conversa sobre desejar atacar o Irã, mas na sequência cancelam o ataque no último momento. Os preços do petróleo sobem um pouco. A mancha de petróleo nos EUA pouco produz, mas jorra tinha vermelha como doida. Precisam de preços mais altos para o petróleo, no esforço para escapar de onda monstro de falências. OK. Essa parte faz sentido. O restante da história? Tsk, tsk, tsk, outra vez!

De qualquer modo, ataque militar contra o Irã continua a ser impensável: o Irã tem capacidade para fechar o Estreito de Ormuz a qualquer tipo de navegação, o que reduz a 1/3 as exportações mundiais de petróleo e faz voar pelos ares a economia global, EUA incluídos. Sumário Executivo: outra vez acontece nada.

O Troll USAmericano no seu habitat nativo


Há variados outros não eventos em outras partes do mundo. Navios da OTAN falam muito dos mares Negro e Báltico, onde se veem muitas patas-chocas, caso as hostilidades com a Rússia tornem-se cinéticas. O que tudo isso nos diz é que nenhuma hostilidade tornar-se-á cinética, porque aqueles navios patas-chocas custam caro e não há dinheiro para substituí-los. Há também manobras da OTAN no Báltico, ali bem junto à fronteira russa. Estão treinando ações de invasão e massacre de civis em pequenas aldeias medievais onde pululam figurantes que falam russo e fingem que são camponeses ansiosos por se render. (Tecnicamente essas ações devem ser definidas como joguinho de faz-de-conta, não como manobras militares.) Os russos absolutamente não se deixam impressionar. Nada querem com os países do Báltico, que sempre foram estados de passagem para exportações russas, mas hoje já não servem para absolutamente coisa alguma (exceto como chão onde a OTAN bate pé).

Seja como for, falar de fazer guerra à Rússia, sem ruborizar, é coisa que só gente extremamente realmente imbecil consegue fazer. Sumário Executivo: acontece nada.

Perceberam o refrão? (Tenho certeza de que perceberam.) O que se vê acontecendo é que um ex-país, que não consegue parar de desperdiçar num inútil, mas ridiculamente inchado complexo industrial-militar, os poucos recursos que lhe restem, tenta gerar agitação, para justificar seu injustificável gasto monstro para ‘defesa’. Todos os tipos de especialistas, peritos e entendidos em geral aí estão, a esbravejar que essa ou aquela ameaça é muito real e que, portanto, temos de prestar atenção ao que ‘acontece’. Problema é que isso que ‘acontece’, é que você foi e continua a ser trolado.

Nada havendo de melhor a ser feito, os EUA tentam furiosamente trolar todo o planeta. Mas o planeta, cada dia mais, ou recusa-se a se deixar trolar, ou, então, trola de volta os EUA.

• Quando os EUA ameaçam cortar o acesso do mundo ao sistema financeiro norte-americano, o mundo trabalha para contornar – deixar de lado, deixar de fora – o sistema financeiro norte-americano.

• Quando os EUA impõem tarifas e sanções, o mundo responde retrabalhando todas as suas relações comerciais para excluir os EUA.

• Quando os EUA ameaçam países com intervenção militar, o mundo responde construindo novas alianças e fazendo novas alianças e arranjos de segurança que isolam os EUA.

Mas, o mais importante: o mundo simplesmente espera. Os EUA administram um déficit no orçamento superior a US$1 trilhão ao ano, faz dívidas ao ritmo em que fazia no auge do colapso financeiro anterior. O que vocês acham que acontecerá, quando eclodir e futuro colapso financeiro? (Segundo várias vozes abalizadas, deve acontecer ainda esse ano, ou ano que vem.) Até lá, espero que vocês amem ser trolados, porque tenho certeza de que ainda vem por aí muita trolagem dos EUA contra todos. Eles precisam, acho, nem que seja para fingir que têm o que fazer.

[1]Random Guy”, aí grafado “Random Guy[]” pode ser traduzido aí por “Sujeito Qualquer Guaidó”, “um-joão-ninguém-Guaidó” (ver Urban Dictionary). O personagem aí referido é Juan Gerardo Guaidó Márquez [NTs].

Traduzido pelo Coletivo Vila Mandinga

Dmitry Orlov, nascido em 1962 em Leningrado (hoje São Petersburgo), é um engenheiro russo-estadunidense e escritor sobre temas relacionados com “o potencial declive económico, ecológico, político e o colapso nos Estados Unidos”, ao que ele chamou de “crise permanente”. Orlov argumenta que esse colapso será o resultado de enormes orçamentos militares, do déficit do governo, de um sistema político irresponsável e do declínio progressivo da produção de petróleo

http://www.tlaxcala-int.org/article.asp?reference=26434


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