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Irã parte para “contrapressão máxima”

Mais cedo ou mais tarde, a “máxima pressão” dos EUA sobre o Irã enfrentará inevitavelmente a “contrapressão máxima”. E haverá sinistras chispas e faíscas.

por Pepe Escobar | Strategic Culture Foundation

TLAXCALA - 24 de junho, 2019

http://www.tlaxcala-int.org/article.asp?reference=26339

Nos últimos poucos dias, círculos de inteligência em toda a Eurásia têm insistido com Teerã para que considere um cenário bem claro: não haveria necessidade de fechar o Estreito de Ormuz, dado que – como explicou pela mídia global, em detalhes, o comandante da Força Quds, general Qasem Soleimani, que o Pentágono teme como sua derradeira besta fera, – Washington simplesmente não tem capacidade militar para manter aberto o Estreito.

Como já noticiei e comentei, fechar o Estreito de Ormuz destruiria a economia norte-americana, porque detonaria o mercado de $1,2 quatrilhão de derivativos; o que levaria ao colapso o sistema bancário mundial, esmagando o PIB mundial de $80 trilhões e gerando depressão sem precedentes.

Soleimani disse também claramente que o Irã pode, sim, fechar o Estreito de Ormuz no caso de o país ser impedido de exportar essenciais dois milhões de barris-dia de petróleo, principalmente para a Ásia. As exportações, que antes das sanções ilegais e do bloqueio de facto impostos pelos EUA alcançariam normalmente 2,5 milhões de barris/dia, podem hoje ficar abaixo de 400 mil barris/dia.

A intervenção de Soleimani alinhar-se-ia com sinais consistentes que chegam do Corpo de Guardas da Revolução Islâmica. O Golfo Persa está sendo descrito como iminente “galeria de tiro ao alvo”. O general-brigadeiro Hossein Salami destacou que os mísseis balísticos do Irã são capazes de acertar “porta-aviões no mar” com absoluta precisão. Toda a fronteira norte do Golfo Persa, em território iraniano, está coberta por mísseis antinavios – o que já confirmei com fontes relacionadas dentro do Corpo de Guardas da Revolução Islâmica.

Quando fechar, vocês logo perceberão

Então, aconteceu.

O comandante do Estado-maior das Forças Armadas do Irã, major-general Mohammad Baqeri, foi direto ao ponto: “Se a República Islâmica do Irã estivesse decidida a impedir a exportação de petróleo a partir do Golfo Persa, essa decisão seria implementada integralmente e a ação seria claramente anunciada, dado que o país e suas Forças Armadas têm total capacidade para fazê-lo.”

Os fatos são claros. Teerã simplesmente não aceitará sem reagir, a guerra econômica total – impedido de exportar o petróleo do qual depende a sobrevivência econômica do país. Com isso, a questão do Estreito de Ormuz está oficialmente decidida. É hora de pensar nos derivativos.

Expor em detalhes a questão dos derivativos acrescida da questão militar ao rebanho da mídia global, principalmente da mídia ocidental, obrigaria os rapazes e moças a correr para Warren Buffett, para saber se é verdade ou mentira. E é perfeita verdade. Soleimani, nesse cenário, deveria dizer também isso e recomendar que a mídia falasse logo com Warren Buffett.

A extensão de uma possível crise de derivativos é tema uber-tabu para as instituições do consenso de Washington. Segundo uma das minhas fontes em bancos norte-americanos, o número mais acurado – $1,2 quatrilhão – veio de um banqueiro suíço, off the record. Disso, esse pessoal entende. O Banco Internacional de Compensações [ing. Bank of International Settlements (BIS) – o banco central dos bancos centrais – tem sede na Basileia, Suíça.

O ponto chave é que não faz diferença o modo como o Estreito de Ormuz seja bloqueado.

Pode ser uma operação de falsa bandeira. Pode ser porque o governo do Irã sinta que será atacado e decida afundar um ou dois cargueiros. O que realmente interessa é o resultado final: qualquer bloqueio no fluxo de energia levará o preço do petróleo a $200 por barril, a $500 ou mesmo, em algumas projeções do Banco Goldman Sachs, a $1.000.

Outra fonte de banco norte-americano explica: “A chave na análise é o que se conhece como valor “nocional”.[1] São coisas tão distantes do dinheiro que se supõe que nada signifiquem. Mas numa crise, o que é nocional pode tornar-se real. Por exemplo, se compro uma remessa de um milhão de barris de petróleo a $300, meu custo não chegará a isso, porque se entende que seja inconcebível que o preço chegue aos $300. É uma questão nocional. Mas se o Estreito está fechado, meu custo pode, sim, alcançar números estupendamente altos.”

O Banco Internacional de Compensações só se comprometerá, oficialmente, com um total nocional para contratos em marcadores derivativos estimado em $542.4 trilhões. Mas é apenas uma estimativa.

A fonte bancária acrescenta que “Mesmo aqui o que realmente significa é o valor nocional. Altas quantias são derivativos de taxas de juros. Muitos são nocionais, mas se o petróleo vai a mil dólares o barril, isso afetará, sim, as taxas de juros, se 45% do PIB do mundo é petróleo. É o que se conhece, nos negócios, como um “passivo eventual” [ing. a contingent liability].”

Goldman Sachs projetou preço possível de $1.000 o barril, para poucas semanas depois de o Estreito de Ormuz ser fechado. Esse número, vezes 100 milhões de barris de petróleo produzidos por dia, nos leva a 45% dos $80 trilhões do PIB global. É autoevidente que a economia mundial entrará em colapso em função de apenas esse fator.

A cachorrada da guerra late como louca

Cerca de 30% do petróleo do mundo transita pelo Golfo Persa e pelo Estreito de Ormuz. Traders experientes, que conhecem bem o Golfo Persa – são praticamente unânimes: se Teerã fosse realmente responsável pelo incidente com o petroleiro no Golfo de Omã, os preços já estariam hoje chegando à estratosfera. E não estão.

As águas territoriais do Irã no Estreito de Ormuz chegam a 12 milhas náuticas (22 km). Desde 1959, o Irã só autoriza trânsito naval não militar.

Desde 1972, as águas territoriais de Omã no Estreito de Ormuz também chegam a 12 milhas náuticas. No ponto mínimo de largura, o Estreito mede 21 milhas náuticas (39 km). Significa, crucialmente, que metade do Estreito de Ormuz são águas territoriais do Irã; e a outra metade está no território de Omã. Ali não há “águas internacionais”.

Soma-se a isso que Teerã já diz abertamente que pode decidir publicamente fechar Ormuz, nada ocultado ou não informado ao mundo.

A resposta bélica indireta, assimétrica do Irã, a qualquer aventura dos EUA será muito dolorosa. O Prof. Mohammad Marandi da Universidade de Teerã confirmou, mais uma vez, que “qualquer ataque limitado que seja disparará resposta forte e não proporcional”. Significa que as luvas já estão no chão, que haverá ação importante, tudo pode acontecer, desde navios-tanques até, nas palavras de Marandi, instalações de petróleo sauditas e dos Emirados, em chamas”.

O Hezbollah disparará dezenas de milhares de mísseis contra Israel. Como Sua Eminência Hasan Nasrallah, secretário-geral do Hezbollah, tem dito repetidas vezes em seus discursos, “a guerra contra o Irã não será contida nas fronteiras do país. Significa que toda a região [o Oriente Médio] arderá em chamas. Todas as forças e interesses dos EUA na região serão varridos, e com eles os conspiradores, primeiros dos quais são Israel e a família saudita governante.”

É iluminador observar atentamente o que a inteligência israelense está dizendo. A cachorrada da guerra late como louca.

No início dessa semana, o secretário de Estado Mike Pompeo voou para o CENTCOM em Tampa para discutir “questões de segurança regional e operações em andamento” com generais – céticos –, eufemismo para “pressão máxima” que pode, claro, levar a guerra contra o Irã.

Muito discretamente, a diplomacia iraniana já informou à União Europeia e aos suíços – sobre a capacidade que o Irã tem para derrubar toda a economia mundial. Mas não bastou para remover as sanções norte-americanas.

Zona de guerra efetiva

No pé em que estão as coisas na Trumplândia, o ex-CIA Mike “A gente mente, suborna, rouba” Pompeo – “principal diplomata” dos EUA – está virtualmente governando o Pentágono. O secretário “em exercício” Shanahan praticou a autoimolação. Pompeo continua a vender ativamente a noção segundo a qual “a comunidade de inteligência está convencida” de que o Irã seria responsável pelo incidente com o navio-tanque no Golfo de Omã. Washington está fervendo de boatos sinistros sobre novas sanções em futuro próximo; Pompeo manda no Pentágono e John “Psico” Bolton é secretário de Estado. Duas maneiras de soletrar “guerra”.

Mas mesmo antes de começarem a voar faíscas, o Irã pode declarar estado de guerra no Golfo Persa; pode declarar que o Estreito de Hormuz é zona de guerra; e banir todo tráfego militar e civil “hostil” na metade iraniana do Estreito. Mesmo sem disparar um único tiro, não haverá empresa de transporte marítimo que aceite meter os próprios navios-tanques dentro do Golfo Persa.

NTs

[1] “Valor nocional É o valor total dos ativos de uma posição alavancada. Este termo é vulgarmente usado em relação a opções, futuros e mercados cambiais, porque estes instrumentos derivados permitem controlar uma grande posição no ativo subjacente mediante o investimento de pequenos montantes. O valor nocional é o valor total do ativo subjacente controlado pelo derivado” [de Gerenciamento Financeiro].

Traduzido por Coletivo de tradutores Vila Mandinga

Pepe Escobar nasceu em 1954 no Brasil, e desde 1985 trabalha como correspondente estrangeiro. Trabalhou em Londres, Milão, Los Angeles, Paris, Cingapura e Bangkok. A partir do final dos anos 1990s, passou a cobrir questões geopolíticas do Oriente Médio à Ásia Central, escrevendo do Afeganistão, Paquistão, Iraque, Irã, repúblicas da Ásia Central, EUA e China. Atualmente, trabalha para o jornal Asia Times que tem sedes em Hong Kong/Tailândia, como “The Roving Eye”; é analista-comentarista do canal de televisão The Real News, em Washington DC, e colaborador das redes Russia Today e Al Jazeera. É autor de três livros: Globalistan. How the Globalized World is Dissolving into Liquid War, Red Zone Blues: a snapshot of Baghdad during the surge e Obama does Globalistan..

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